Livro | The Double Me - 5x17: You Should See Me In a Crown
5x17: You Should See Me In a Crown
“Se falhar a guilhotina, a forca há de servir'.
O mercado de rua estendia-se em linha reta
para mais do que Alex conseguia enxergar. Tendas diversas ocupavam a lateral de
cada acostamento, e as grandes lojas, à retaguarda, faziam-se visíveis pelas
fachadas suspensas. Havia um espaço aberto no meio de uma encruzilhada onde
dançarinos investiam em passos de Ahouach
– um típico ritmo de matriz africana. Alex parou para assistir junto aos outros
turistas no grande círculo.
Logo adiante internava à seção de roupas, calçados
e utensílios. Tudo parecia ao seu alcance, a começar pelas estátuas de buda e
animais empalhados, e quando não pelas burcas e a extensa variedade de quimonos.
A tenda de artefatos coloniais lhe chamou mais atenção. Um espelho giratório foi
posicionado no lugar da vidraça de ampulhetas, formando miniaturas refletoras
com duas colunas ao redor, como as de templos antigos. Foi ao girar uma delas
que ele notou estar sendo seguido.
O homem no reflexo era alto, forte e careca,
com uma meia tatuagem de dragão no lado direito do rosto. Vestia uma jaqueta de
couro negro, botas de combate, camiseta vinho e um jeans desbotado. Alex
lembrava de tê-lo visto no ônibus coletivo junto a outros dois homens, de mesmas
vestes. Um deles estava à direita da tenda, fingindo conversar ao celular. E o
outro em uma fila de sushi e yakisoba.
— Quanto custa? — Perguntou a vendedora.
— Quinze dólares — Ela respondeu.
Alex pagou por um dos espelhos e seguiu seu
caminho. Alguns metros à frente só fez dobrar em uma tenda, pagar por uma
jaqueta nova, pegar um boné esportivo com o vendedor ao lado e livrar-se de sua
sacola de compras. Quando deu meia volta, os três homens haviam parado em meio
ao fluxo de pedestres, talvez a planejar uma estratégia. Um deles seguiu adiante,
por onde Alex deveria ter ido, e os outros dois voltaram pelo mesmo caminho.
Alex caminhou por entre as vias até encontrar
uma passagem subterrânea para o metro. Comprou um bilhete e entrou no vagão
dois segundos antes da porta se fechar. Veio um suspiro de alívio.
Não pareciam ladrões, pois este era o trabalho
de um único homem e sua arma de fogo. Talvez sequestradores, mas apenas Octavia
e sua família sabiam de suas posses – e eram tão ricos que não precisariam de
um centavo seu. Fazia sentido ser algum trapaceiro do jogo de pôquer tentando
reaver a fortuna perdida. Ou, inevitavelmente, seus irmãos. Imaginava que um
dia batessem em sua porta e o acordassem de seu pesadelo aterrador. Não Toronto, ser ninguém todos os dias.
Octavia e o Senhor Genovich, seu arquiteto, debatiam
sobre as planilhas na sala de estar do apartamento. Alex estava tão distraído
que só os cumprimentou ao ouvi-los primeiro, já a caminho da suíte.
Octavia seguiu seus passos.
— Está tudo bem? — Ela perguntou.
Alex tirou primeiro a camiseta.
— Eu não sei... — Sentou-se à beira da cama
para tirar os sapatos. — Tive impressão de estar sendo seguido no mercado de
rua. Na verdade, tive certeza.
— É uma área perigosa, todos os dias há
relatos de assaltos.
— Não foi o que me pareceu.
— Se acha que foi pessoal, deveríamos chamar a
polícia.
Alex pensou a respeito. Se fosse um de seus
irmãos, o mais prudente seria evitar o alarde. Não que admitisse, de fato, que
reconhecera a estratégia. Por que Nate, Gwen ou Mia usariam homens suspeitos para
coletar informações quando poderiam encontra-lo pessoalmente? Por ter assinado
os papeis da Union Nightclub, e por
ser o único proprietário do novo apartamento, não seria uma tarefa difícil. Algo
mais estava acontecendo.
— Não é necessário, o susto passou — Tirou o
último sapato. — Como anda o projeto?
— Estamos progredindo — Ela tomou a poltrona
da janela. — Amanhã reuniremos a equipe de construção. Tem certeza não podemos
falar a alguém sobre o que aconteceu?
— Nada aconteceu. Aqueles homens poderiam
formar um time do Czech Hunter prestes
a me fazer uma proposta.
— Você sempre faz piada quando tenta evitar um
assunto.
— E você é a minha nova irmã gêmea. Ótimo —
Foi até o armário.
Octavia levantou-se.
— Estaremos na sala de estar, vista algo
decente. Ou vá assim mesmo, talvez o Senhor Genovich se inspire.
— Sua esposa discordaria.
— Ainda é uma grande oportunidade. Não pode
transar às escondidas com Cody e chamar isso de vida sexual por muito tempo — Disse
ao sair.
Alex sorriu impressionado. Sua nova sócia, senhoras e senhores.
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Um importe de guarda-chuvas negros ladeava o
caixão e o pedestal sagrado onde o padre realizava suas preces. Travis era o
único desprotegido em meio a eles. Não reagia ao frio, embora visível que o
afetasse. O irmão observou-o com pesar durante a cerimônia.
Após uma hora, todos voltaram à mansão Van Der
Wall. A chuva cessou a caminho, finalmente, mas tudo ao redor estava ensopado. Nate
e Thayer tiveram problemas com lama e respingos das folhas das árvores no
trajeto pelo jardim dos fundos. Estavam relembrando os momentos marcantes de
Theodor Van Der Wall e tudo o que aprenderam a não fazer com seus péssimos
exemplos.
— Lembro quando ele nos flagrou assistindo
pornografia na internet — Nate disse.
— Éramos dois pré-adolescentes, mas sua única
crítica foi sobre a escolha do filme.
— Seu pai sempre soube de você?
— Desde que eu me lembro. Quando eu tinha sete
anos minha mãe insistiu que eu convidasse Linda, a filha mais nova dos Van Der
Driessche, para ser meu par no baile de colação. Theodor olhou para ela por
cima dos óculos e disse, nas exatas palavras: “Nada com uma buceta chegará tão perto
de nossos filhos, é melhor se acostumar”. Minha mãe chorou por duas noites
seguidas.
— Por que eu não ganhei um pai nesse estilo? —
Desde pequeno sonhava.
Ao longe viram um time de seguranças frustrar
os planos de outro paparazzo que pulou os muros. Era o terceiro só naquela
tarde; eles não paravam de chegar.
— São de uma classe obstinada — Thayer frisou.
Escorou-se em uma árvore e ergueu a cabeça, de
olhos cerrados. Os respingos caiam-lhe sobre a pele como uma brisa gelada.
— No que está pensando? — Nate perguntou.
— Que lembrarei deste dia todos os anos no meu
aniversário
— Você se surpreenderia com nossa resiliência.
— É um desperdício aos que mantêm expectativas
nulas. Meu irmão espera muito mais de mim.
— Ele acabou de perder o pai. Nada que você
fizer será comparado ao que ele faria se estivesse aqui, porque o problema é
ele não estar.
Thayer sorriu angustiado.
— Estou sempre esperando pelo pior. Alex fugiu
da cidade, Mia viajou para Londres e você tomou o lugar do irmão gêmeo. É assim
que lidamos com problemas familiares por aqui.
— Temos nossas soluções a curto prazo — Nate
escorou-se ao lado dele. — Não há como não passar por todo esse processo de
perda e superação sem enlouquecer ocasionalmente.
— Nunca estamos preparados para isso.
— É a pior parte. Não daria certo ter esta
conversa sem álcool.
— Aqui está — Thayer entregou-o uma garrafa de
bolso. — Nunca me separo dela.
Era uma de muitas coisas que Nate apreciava em
sua amizade.
— Vi você e Dominik na TV, outro dia — Thayer
mencionou. — Na verdade, todos esses dias. Não param de reprisar a cena do
beijo coletivo.
— Desculpe não ter contado, estava em dúvida
se viraria algo sério.
— Agora você sabe?
— Agora todos sabem, por assim dizer.
— A internet os chama de DominAlex, mas podemos chamar de DomiNate quando estivermos a sós. É um nome interessante para um shipp.
— Cala a boca — Nate tomou outro gole. — Ele
me disse “Eu te amo” pela primeira
vez há algumas noites.
— E o que você respondeu?
— Ta brincando? Eu quase saí correndo — Na
próxima vez em que se viram, também foi quase.
A Thayer soava como algo que o
verdadeiro Nate faria.
— Ele sabe que você é você? — Perguntou.
— Não precisei contar, ele é inteligente. Mas
está comigo, então nem tanto.
— Tem cara de ser rosadinho.
— Acertou. E também é apertado.
— Imaginei. Seja cuidadoso.
Nate franziu o cenho.
— Por que?
— Lembra de mim aos quinze anos? Eu só pensava
em pegar o maior número de paus a minha disposição. Qualquer um que se
apaixonasse por mim naquela época teria sérios problemas.
— E tiveram — Nate lembrava bem.
Um deles, chamado Niall Ulrich, o surpreendeu
com uma festa de despedida no começo do verão. Thayer transou com um de seus
primos na hidromassagem. Outro, chamado Lucas Sinclair, ofereceu-se a leva-lo
em uma viagem pela Ásia central, dizendo aos seus pais, como pretexto, que
faria um intercâmbio. Thayer contou tudo a eles a pedido de seu irmão mais
velho, com quem se relacionava há mais de quatro semanas. Nate não lembrava o
nome do jovem rapaz que apareceu bêbado nos portões da mansão Van Der Wall e foi
expulso pela mãe de Thayer. Lembrava apenas de alguém ter publicado na internet
o momento em que ela o atingiu com água gelada no rosto.
— Fazemos coisas estúpidas na adolescência —
Thayer disse.
— Que seja, não estou apaixonado por Dominik.
— Eu vi o beijo. Era como você e Jensen.
— Nunca será como eu e Jensen — Fitou o
horizonte. — O que isso diz sobre mim?
E outra vez estavam os seguranças a perseguir
um paparazzo no jardim da mansão. Foi ideia da Senhora Van Der Wall soltar os
cachorros.
— Eles não desistem — Nate observou.
— Temos cães igualmente obstinados.
Eles riram juntos. Não fazia tanto tempo,
parecia muito tempo.
— Obrigado por estar aqui — Thayer disse. — E por
falar comigo sobre qualquer outra coisa que não seja o que está acontecendo. Hoje
foi um longo dia.
— Eu imagino. Mas deveria estar com sua
família agora.
— É difícil olha-los nos olhos.
— E será por um longo período; a ideia é
passar por isso juntos. Travis pode estar neste exato momento perguntando-se porque
não há ninguém para falar sobre qualquer outra coisa que não seja o que está
acontecendo.
Thayer assentiu, pensativo.
— Estarei sozinho?
— Nunca — Se
dependesse de Nate.
Voltaram juntos pelo jardim, passando a matilha
de cães. Thayer mal havia entrado pela porta e o irmão o acertou com o punho no
rosto. Todos voltaram a atenção.
— Seu filho da puta! — Travis gritava.
Foi necessário três homens para imobiliza-lo.
— Por que fez isso? — O irmão o encarou.
— Você escreveu sobre ele, agora todos sabem!
— Jogou-lhe ao rosto um maço de folhas impressas.
Thayer apanhou algumas no colo, o restante caiu
sobre seus pés. O Linnard Report
relatava em primeira mão sobre a vida secreta de Theodor Van Der Wall e a
amante de luxo antes de estarem envolvidos em um trágico acidente na aeronave
da Delta Air Lines. No fim do texto,
Thayer leu o próprio nome como atribuição de autor.
— Eu não escrevi isso!
— É o seu nome na página — O irmão contestou.
— Pode ser forjado. Não faria isso com ele,
nem com você.
— Acho difícil de acreditar.
— Travis, juro que não tive nada a ver com essa
história.
— Então quem escreveu?
O único a
ter acesso irrestrito aos perfis de usuário no Linnard Report. E o único propenso
a lucrar com esta notícia.
Thayer sentiu o sangue ferver.
— Darei um jeito, espere por mim aqui — Disse
ao sair.
Nate chamou seu nome, e ele disse não como se fosse um aviso.
Resolveria entre ele e Colin.
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A Senhorita Rhae havia marcado às nove no The Palm at the Huntting Inn, em East
Hampton. Por coincidência, Viola atendeu a primeira cliente do dia naquela mesma
região. Um vestido azul tiffany de
alça bordada junto a um scarpin nevado
da Manolo Blahnik couberam a ocasião.
Cassidy preparava-se para realizar o pedido
quando ela chegou.
— Nos dê um minuto — Disse à garçonete. — Achei
que havia se perdido.
— Sinto muito — Tomou o segundo lugar. — Precisei
atender à uma visita.
— Outro casamento?
— Um baile de debutantes. Tornei-me especialista
em fazer vadiazinhas de quinze anos
se sentirem como princesas.
— Admiro sua honestidade. Fazemos o pedido? —
Sugeriu.
Viola tinha outra ideia em mente.
— Na verdade, não podemos ficar. Eu tenho uma
surpresa.
— Isso só funciona quando é Liam quem diz.
— É sobre Liam também, ele vai gostar.
— Neste caso... — Deixou o menu ao lado do prato.
— Quem precisa comer?
As luzes fluorescentes revelaram um vestido de
noiva ao centro do estúdio de criação da Sebert
Designs. Cassidy foi até ele com brilho nos olhos.
— É um dos seus? — Perguntou num sussurro.
A tule de seda envolvia do abdome aos
calcanhares com renda bordada sobre a primeira camada, transparente, e visível
nas alças, costas e busto. A cauda projetava-se dois metros atrás do manequim
como um trilho nevado, formando um V de ramificações. Havia ainda uma coroa de
flores, saltos cristalinos e um véu a proporção do vestido.
— Foi meu primeiro design — Viola deu um passo à frente. — Comecei o tratamento
hormonal aos dezesseis anos, sem o consentimento de meu pai. Ele costumava me
trancar no quarto de hóspedes, durante os eventos, para que ninguém descobrisse
a aberração andrógena que ele estava criando. Em uma dessas noites, assisti a
um programa chamado The Veil, que levava
semanalmente duas noivas a competir por um casamento patrocinado. Lembro de
pensar que os vestidos eram tão horrorosos que eu desistiria do meu próprio
casamento se tivesse vencido. A partir desta ideia, criei o meu próprio. Levou
algumas semanas para finalizar o desenho, e cerca de um mês para coloca-lo em
prática. Desejei minha vida inteira ser a mulher certa a usá-lo.
— É perfeito — Cassidy tateava o tecido.
— Que bom que achou. Ele é seu.
Ela olhou assustada.
— Viola, não. É para o seu grande dia, eu
nunca poderia aceitar.
— Esta ideia parece muito distante agora. Não
há nada mais importante que minha carreira para mim.
— Você encontrará alguém.
— Eu sei — Viola sorriu. — Não me convém
restringir-me ao estereótipo de solidão eviterna por ser diferente das outras
mulheres. Quero que fique com ele pois sei que será tão feliz quanto eu seria.
— Não sei o que dizer.
— Não diga, ainda precisamos ajusta-lo às suas
medidas. Suponho que dinheiro não seja um problema.
Cassidy colocou uma mecha atrás da orelha.
— Supõe corretamente.
— Prove — Viola incentivou.
Enquanto as assistentes realizavam os pequenos
ajustes, observou-a de longe. Como não
escolhe-la? Liam não precisaria pensar.
— É incrível — Cassidy elogiou. — Não tenho
como agradecer o bastante.
Viola apenas sorriu.
Mais tarde voltou ao apartamento com uma
garrafa de whisky, fast food e filmes
em Blu-ray. Cameron enviou uma
solicitação de chamada de vídeo pelo computador.
— É um momento ruim?
Viola jogou-se sobre a cama de braços abertos.
— Eu sou uma boa pessoa.
— Boas pessoas não dizem isso — Ele mordiscava
uma tampa de caneca em frente à mesa do escritório.
— Quem dera eu não fosse. Minha vida seria
menos complicada.
— O que aconteceu?
— Concedi meu vestido de noiva à Cassidy Rhae.
Cameron ergueu as sobrancelhas.
— Você é, definitivamente, uma boa pessoa.
— Eu sei. Só me fodo por isso.
— Veja pelo lado bom, você não está apaixonada
pelo seu noivo.
— Boa noite, Cameron — Finalizou a chamada.
Ainda era sábado; Liam estaria no Pretty Wolf com os amigos para a
despedida de solteiro. Uma ideia lhe veio à mente mais rápido que o alerta de
consciência pesada.
Levantou da cama e foi até o armário escolher
o vestido que de mais propicia a ambição.
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— Fica bem em você — Kieran disse a ela.
Gwen encarou-o pelo espelho do provador.
— Deveria me ver em uma coroa.
— Chegaremos lá — Ele se aproximou.
O vestido de prova era um zibeline cor de
ameixa com uma placa dourada no quadril superior e um decote aberto. Avinha perfeitamente
ao colar de ametistas que ele revelou.
— O que está fazendo? — Ela o via erguer seus
cabelos e fixar o encaixe.
— Perdoando você. E implorando de volta o seu
perdão.
— Pode implorar melhor que isso — Como na última vez.
De repente, uma vendedora os flagrou.
— Você não pode ficar aqui! — Disse a Kieran.
Gwen dispensou-a com um olhar impaciente e as
exatas palavras ‘deixe-nos a sós’.
— Sei ter merecido o que aconteceu — Ele
disse. — Mas não pense que esqueci a promessa de quando deixei a prisão.
— Diga novamente.
— Nunca mais encostarei as mãos em você, a não
ser que me peça para fode-la como um animal.
— Eu não peço, eu ordeno.
Ele agarrou-a por trás e beijou-a no pescoço.
Gwen cerrou os olhos.
— Tenho uma surpresa para você esta noite... —
A voz dele era apenas um sussurro. — Use este mesmo colar.
— E se eu não for?
— Não saberá o que está perdendo — Beijou-a uma
última vez.
Lembrava a ela de sua primeira noite juntos,
quando convenceu-a a provar Black Widow
pela primeira vez. Gwen tinha dito aos pais que dormiria na casa de Amber, e
Amber tinha dito aos seus que dormiria na mansão Strauss. Foram juntas da estrada
de praia, onde encontraram os rapazes, ao estacionamento do Melody Lane, às duas da manhã de uma
quinta-feira.
O curioso sobre o Black Widow era o seu poder atrativo. Os usuários passavam mais
tempo a apreciar o pó brilhante arroxeado que duraria os efeitos após o
consumo. Outra coisa que chamou-lhe a atenção; a viúva negra era de um roxo
cintilante, não de um negro fatal.
— Não saberá o que está perdendo — Kieran
disse enquanto estavam no camarote.
Suas lembranças iam só até aí. Inalou na
bancada, esfregou o nariz e ergueu a cabeça no encosto do sofá. Quando deu por
si, estava em um volante no meio da rodovia vinte e dois. Houve um acidente,
foi o que disseram. Talvez, se concentrada o bastante, pudesse lembrar o som do
impacto.
Ela fechou os olhos e ouviu outra vez.
— É a polícia! — Kieran gritou.
— Saia do carro! Saia do carro! — O outro
amigo tomou à frente.
Deixaram-nas sozinhas, em meio a rodovia, e
como se nunca tivessem estado lá. Donato Foster cobrou à juros o favor que lhe
fez em não contar a Judit e Simon o que aconteceu naquela noite. Até onde sabiam,
Amber e ela sofreram um acidente no estúdio de balé.
— Eles não me conhecem como você... — Ela sussurrou
ao espelho.
Não via a si mesma sem vê-lo também.
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Gelo falso cobria as paredes, escadas, janelas
e assoalho do hall da mansão. Um simulador de neve artificial, ao alto nos
lustres, esguichava os flocos à superfície da pista de dança. O inferno é gélido, Jensen entendera a
referência.
Não fazia duas horas que chegou da casa dos pais.
Austin estava tão envolvido na organização que decidiu perdoa-lo por tentar
burlar a Hell Week – pelo menos por
enquanto. Na próxima semana contariam uma história totalmente diferente ao
conselho estudantil. Austin retiraria sua indicação como sucessor da Delta Beta Psi, e Jensen faria uma
própria, contra a vontade dele. Estava certo dos votos de Ryan, Boneta, Phillipe,
Jesse e Troye; os outros garotos implicariam em uma disputa.
No fim do salão, notou um dos calouros amarrado
em um pedestal sintético. Os que passavam em frente a ele despejavam bebidas
alcoólicas e cubos de gelo através do funil em sua cueca. Estava de venda,
então não os via chegar até que fosse tarde.
Jensen desceu o último lance de escadas.
— O que aconteceu? — Perguntou a um rapaz de
boné e jaqueta esportiva.
— Ele perdeu a insígnia — O jovem explicou. — Encontraram
na piscina, mas ele ainda não sabe disso.
Jensen balançou a cabeça negativamente.
Avistou, no outro cômodo, Trent Maddox. Só tinha olhos à paisagem do lado de
fora, pelas portas de acesso à varanda.
Jensen caminhou até ele com um copo de cerveja
em mãos.
— Está olhando na direção errada — Brincou.
— Não estou convencido. Uma festa na Delta House pode ser mais hostil que a
floresta lá fora.
— Da forma que eu vejo, há animais selvagens em ambos os
cenários.
— Com exceção de você.
— Eu não disse isso — E não se excluiria desta
forma.
Trent sorriu amistoso.
— Sentimos sua falta na classe. O Senhor Baumann
encarregou-me pessoalmente de chamar a polícia.
— Ele sabe ser bem paternal.
— E inconveniente. Confundiu-me com um de seus
namorados na frente de todos.
Jensen gargalhou.
— Você está brincando?
— Eu disse não fazer ideia sobre o que aconteceu,
e ele disse ter achado que nós tínhamos uma relação mais íntima.
— Porque dois jovens gays não podem
simplesmente ser amigos.
— Homens héteros...
— Homes héteros... — Jensen concordou.
O copo nas mãos de Trent estava ainda pela
borda. Até aquecera a bebida, de tanto tardar em seu ritmo. Havia mesmo comentado
sobre o desafeto que tinha às tradições juvenis. Álcool não, apenas bebidas com gás.
— Então, o que aconteceu? — Ele perguntou a
Jensen.
— Precisava de um pouco de ar.
— Não o que compartilhamos com os irmãos da
fraternidade, entendi.
— Descobri que meus pais se casariam outra vez.
Imagine a minha surpresa, sabendo que ela o traiu com o dentista e abandonou os
dois filhos pequenos para viver uma grande aventura romântica em Moscou.
— Você está brincando?
— Antes estivesse. Mal me sinto parte daquela
família, ou qualquer família.
Um barulho de água esguichada os tirou a
atenção. Olharam os dois para trás; outra
disputa de salto à piscina.
— Quer dar uma volta? — Trent convidou.
No exato momento, Austin foi de
escorão ao passar por eles. David, Timothy, Sean, Gabriel, todos escoltavam
Ryan, um dos calouros, ao segundo andar da mansão. Jensen observou-os
desconfiado.
— Você me ouviu? — Chamou Trent.
— Sinto muito.
— Perguntei se quer dar uma volta.
Jensen olhou uma última vez enquanto eles
trancavam-se em uma das suítes.
— Tudo bem, vamos sair daqui.
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— Ele está aqui— Dawn anunciou.
O grupo de editores acompanhou em silêncio o
percurso de Thayer ao escritório principal. Colin acabara de dispensar os
serviços de Olivia para aquela noite.
— Faremos amanhã — Thayer somente ouviu-o
dizer.
Seu cumprimento veio de punhos fechados.
— Diga que foi você! — Acertou-o no rosto.
— Não quer conversar sobre isso?
— Diga! — Acertou-o outra vez.
Colin mostrou um sorriso sangrento enquanto
ele o tinha pelo colarinho da camisa.
— Foi ótimo tê-lo a bordo, Senhor Van Der
Wall. Somos infindamente agradecidos pela notícia que impulsionou nossas
vendas.
Thayer acertou-o outra vez, outra vez e outra vez.
Quebrou contra seu rosto os pequenos objetos que podia alcançar na mesa, jogou-o
contra a estante lateral, que rompeu em milhares de cacos de vidro. Terminou
quando Colin já estava no chão, inconsciente, e Thayer em pé ao seu lado, massageando
os punhos.
Os outros editores amontoaram-se na entrada.
— Ai meu Deus... — Dawn sussurrou.
Russell arregalava os olhos, Paige cobria os
lábios com as duas mãos, Troye sorria impressionado, Marty limpava os óculos
para enxergar melhor, Olivia filmava os eventos com a câmera do celular.
— Querem fazer algum dinheiro com isso? —
Thayer referia-se à gravação. — Eu tenho uma ideia.
Next...
5x18: Bienvenue From Hell, Mon Amour (Season Finale) (07 de Abril)
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