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Livro | The Double Me - 6x08: You Were Never Mine [+18]

   6x08: You Were Never Mine
“Tudo aquilo em que ponho afeto fica mais rico e me devora".

— Devagar... — Pediu Dominik.
Nate alocou as pernas dele em seus ombros, abancando-o por cima. Seus rostos colados um no outro.
— Assim está bom?
— Sim... — Sussurrou Dominik; embora seu olhar dissesse que não estavam em sintonia.
Quando terminaram, na cama, deitados lado a lado, Nate finalmente perguntou:
— Algo o preocupa?
— Não. Está tudo bem.
— Parece que algo o preocupa — Nate insistiu.
Dominik sentou a beirada, trouxe as roupas para perto e vestiu uma peça de cada vez.
— Não, sinto muito — Respondeu a ele. — Estou meio cansado pela noite de ontem.
— A festa de Garrett?
— Isso também. Meu pai me obrigou a ir a um jantar com os acionistas, que estava mais para um cerimonial. Parece que o novo Shopping vai mesmo acontecer.
— É, você mencionou — Nate ergueu os olhos.
Podia vê-lo de costas, de seu lugar à poltrona. Os músculos de Dominik pareciam tensos.
— O que acha de acamparmos semana que vem? — Nate sugeriu.
— O campeonato é em duas semanas, preciso treinar.
— Até nos sábados?
— Até conseguir quarenta e cinco segundos — Dominik amarrou os cadarços. — Fica pra próxima?
— Claro — Nate assentiu.
Foi o que disse da última vez. E da outra vez. E da outra vez.
Tudo bem.
— Preciso ir agora — Dominik levantou. — Bethany e eu vamos ao jogo dos Lions.
— Eu ligo mais tarde?
— Está bem — Pegou sua mochila.
Ele não tinha o costume de sair assim, sem se despedir. Nate pensou sobre isso mais do que gostaria.
Duas horas mais tarde, pediu ao motorista que pegasse Gus de limusine e esperou em frente ao orfanato.
— Paaaaai! — O menino correu até ele.
Foi uma surpresa vê-lo de camisa polo, suspensórios, calças jeans e os cabelos penteados para o lado com muito gel e spray.
— Quem é você? Marcelino Pão e Vinho?
— Não — Disse o garoto. — Victor e Sarah me vestiram assim.
— Isso é óbvio — Nate olhou por cima do ombro dele.
A Assistente Social os observava da portaria, usado um terno Armani negro, saias midi, blusa social e um par de scarpins em verniz. Não adiantava tentar lembrar seu nome, pois a pronúncia lhe era incompreensível. Nate referia-se a ela apenas como a Blake Lively de um Não Tão Simples Favor, devido a semelhança em seus traços físicos e pela forma de se vestir.
— Devo traze-lo a que horas? — Ele perguntou.
— Por volta das dezessete — Respondeu a jovem moça.
Aquela era a pior parte. Ter que dividir os sábados com o Senhor e a Senhora Frankenstein e dispor somente de algumas horas da tarde para ele e Gus. O acordo designava dias específicos para cada um, no decorrer da semana. Mesmo assim...
Nate colocou-se de pé, apoiando as mãos nos joelhos.
— Anda, vamos logo ao parque! — Gus o puxou pela barra da camisa.
— Não antes de comprarmos roupas novas — Disse a ele, então virou a assistente social. — Muito obrigado, Senhorita...?
Zwiesigk.
— É isso aí — Ele sorriu.
Dentro da limusine, Gus pediu que o emprestasse seu celular.
— Não posso, garoto — Disse Nate. — Há coisas de adulto aqui.
— Seus rolos não me importam — Gus revidou. — Quero assistir vídeos no YouTube.
— Meus rolos? É assim você chama?
— Todos os adultos têm rolos. Está tudo na memória do celular.
Uma risada escapou.
— Aqui — Entregou-o. — Você tem vinte minutos até chegarmos.
— Onde vamos primeiro?
— Brunello Cucinelli. Precisamos vesti-lo adequadamente.
— Mas eu gosto dessas roupas... — Gus olhou para ele.
— Sério?
Fez que sim com a cabeça.
Nate viu ali uma boa oportunidade de dizer o que nunca o disseram.
— Tudo bem — Abraçou-o. — Vamos a várias lojas e você vai escolher sozinho.
— Qualquer coisa?
— Qualquer coisa que não me ponha em apuros — Muito importante lembrar.
O resto da viagem eles fizeram ouvindo músicas infantis nos canais da Cocomelon e Koo Koo Kanga Roo. Nate mantinha o tempo inteiro aquele olhar no rosto, de um pai orgulhoso. Talvez ele mesmo não notasse.

Alex se aproximou da vidraça e o viu sentado lá fora, no topo das escadas, tomando de sua xícara de café.
 — Está aqui há muito tempo? — Perguntou.
— Não, acabei de acordar — Disse Henry.
Os passos de Alex pararam atrás dele. Sentou-se ali.
— É tão calmo a essa hora do dia...
— Eu sei... — Henry olhou para o céu. — Acho que a tempestade está passando, logo vão liberar as rodovias.
Alex também olhou. Era verdade. As montanhas projetavam-se à altura do céu, sem a neblina para encobri-las. Os raios solares alcançavam as áreas mais remotas do campo e inundavam as florestas.
— O que faremos agora? — Ele sondava.
— Diga-me você — Henry o encarou por cima do ombro. — Se sente em condições de viajar?
— Acho que sim.
— E as dores?
— Melhorando a cada dia.
— Os remédios?
— Ainda tenho duas caixas.
— Certo... — Virou de volta.
Em suas mãos Alex notou um pequeno fragmento de rocha, em cascalho, que ele usou para tentar acertar uma árvore. Talvez tenha conseguido, talvez não. Àquela distância era impossível dizer.
— E se eu não quiser ir? — Alex mais admitia.
Novamente, Henry o encarou por cima do ombro.
— Você não precisa — Lembrou a ele. — Podemos ficar aqui.
— Podemos?
— Por agora. Não há porque nos precipitar.
— Ainda mais?
Eles riram juntos. E da mesma forma que começou, o momento terminou.
— Não sei fazer isso, Alex — Henry dizia. — Posso não ser o cara que o ignora e finge que nada aconteceu, mas temo que não seja o bastante.
— Isso é normal. Acho que todos se sentem assim durante a descoberta.
— Não eu. Eu não sou...
— Eu sei — Deixou claro. — Há o que você pode amar e há o que pode fazer com o seu corpo. Os dois não precisam ser a mesma coisa.
Henry respirou fundo.
— Você acredita nisso? — Perguntou.
Alex o calou com um beijo.
— Eu não acredito em rótulos. Estou aqui, você também. Isso me basta — Entrelaçou seus dedos.
Dessa vez, Henry o beijou. Nada mais precisava ser dito, a não ser...
— Café da manhã?
— Claro, eu o ajudo — Alex sorriu.
Henry foi na frente, ele ficou para pegar uma pedra e arremessar em direção às árvores. Não importava que não acertasse.

Thayer elaborou seu próprio mural investigativo no escritório da Linnard Report, com base no que foi encontrado na casa de Ivy, nos registros policiais e nos depoimentos de Natasha. Seus recursos permitiam que fosse ainda mais longe na investigação, agora que tinha um nome e um suspeito em Londres.
Enquanto falava ao celular, registrava todas as informações na lousa branca.
— Um ex policial? — Escreveu em letras maiúsculas. — Há quanto tempo? — Hesitou. — Entendo. Tem a localização? — Hesitou outra vez. — Tudo bem, eu espero.
Esse foi o tempo que Dae levou para sair do elevador, caminhar até sua sala e abrir as portas. Thayer virou no momento exato em que ele jogava um maço de folhas sobre a bancada.
— Quem o deixou subir? — Perguntou.
— Sua amiga, Dawn. Ela queria que soubesse disso porque está chateada com você.
— Bem... eu estou ocupado — Virou à lousa.
Dae olhava para ele com reprovação.
— Que porra acha que está fazendo?
— Como é?
— Eu sei que mentiu na primeira vez para preservar a imagem de Theodor, mas continuar veiculando essas mentiras não passa de oportunismo. Por quanto tempo ainda pretende capitalizar a morte dos nossos pais?
Thayer cruzou os braços.
— Eu devo ter te fodido até saltar os miolos, pequeno K-Idol, porque isso tudo é loucura — Deu um passo à frente. — Acha que é só não tocar no assunto e deixar tudo para trás? Não é. As pessoas fazem perguntas o tempo inteiro e eu preciso estar lá para controlar a narrativa.
— Não importa quem saia prejudicado?
— Eu o prejudiquei ao não dizer publicamente que sua mãe e meu pai tinham um caso?
Dae mostrou um sorriso debochado.
— Você não entende, não é? Essas mentiras generosas, as quais tentam nos convencer, não vão mudar nada. Eu enterrei uma estranha por sua causa. Recebo flores, cartões e presentes todos os dias, em homenagem a alguém que nunca existiu. A mulher perfeita, acima de qualquer suspeita — Pegou uma das folhas na bancada e começou a ler. — É ao menos verdade que ela seria jurada em um concurso de beleza no Hawaii?
— Não, eles nunca ouviram falar dela — Thayer confessou.
Uma lágrima escorreu no rosto de Dae.
— Ninguém a conhece — Murmurou. — Nunca vão saber que ela estava naquele avião porque amava seu pai e iria ao seu lado para qualquer lugar. Ele era o amor da sua vida. Acha mesmo que isso pode arruinar sua reputação?
— O boato quase arruinou. Perdemos dinheiro, contatos. Minha família inteira se dividiu. Nos trataram feito párias na indústria editorial. É isso o que quer para a sua família?
O outro deu de ombros.
— Se as pessoas soubessem a verdade...
— Tudo mudaria — Thayer o interrompeu. — Eles não teriam pudor ao falar de sua mãe, se não tiveram ao falar de meu pai. O resto da sua família sentiria vergonha, como minha mãe sentiu. Saiu em todos os jornais que ela precisou deixar o país para fugir do assédio da imprensa e hoje faz acompanhamento psicológico. Você, que acha ruim receber flores, cartões e presentes todos os dias, saberia lidar com o linchamento virtual, as falsas acusações e todo o julgamento? Se sentiria seguro em casa, mesmo protegido por um time de seguranças que impede os paparazzi de invadir a propriedade? Porque eles irão. Um clique seu e da sua miséria os faria um pouco mais ricos. E se puder voltar a faculdade no próximo semestre, seria muito sortudo. Nenhuma instituição se expõe ao ridículo diante aos escândalos da vida pessoal dos alunos.
— Você diz isso para me amedrontar?
— Digo por ser a verdade. Não sirva sua cabeça em uma bandeja àqueles que mal podem esperar.
Dae virou-lhe às costas e caminhou em direção à saída.
— Você já se certificou disto — Acusou.
Thayer esperava que um dia ele pudesse entender.
Voltou ao mural, do último ponto. A foto de Mia parecia instiga-lo.
— Onde você está? — Sussurrou a pergunta.
Naquela manhã, as duas garotas foram levadas a um banheiro coletivo e tomaram banho com jatos de alta pressão. Logo depois foram deixadas ali, sem roupas, no frio. Os dois homens de colete diziam ter que puni-las por mau comportamento, ou se recusariam a cooperar. Mas elas sabiam que os agradava a submissão, acima de qualquer outra coisa.
Horas se passaram enquanto estavam encolhidas, no chão, lado a lado.
— Quanto tempo vão nos deixar aqui? — Perguntou Hannah.
— Querem que a gente quebre — Mia disse a ela. — Aguente firme.
— Tudo bem.
Foi ideia de Mia que elas friccionassem suas mãos umas nas outras por um pouco de calor.
— Ainda dói? — Mia referia-se aos hematomas.
Havia mais deles no pescoço, nas costas e nos quadris.
— Um pouco — Disse a menina. — Eles não sangram mais.
Os dedos de Mia deslizaram sobre as marcas.
— Se eu pedir uma coisa... você faria? — Perguntou-lhe.
— É algo... algo que vai nos causar problemas? — Seus dentes trincavam.
— Sim — Assentiu.
Hannah puxou de volta suas mãos.
— Eu não quero... problemas.
— Tudo bem... — Mia engoliu em seco. — Apenas espere pelo meu sinal.
— Sinal de que?
— Você saberá.
De repente, abriram os portões. Mia e Hannah olharam ao mesmo tempo.
— Interrompo alguma coisa? — Adentrou o homem de colete lilás.
Não demoraria muito até que ele e todos os outros soubessem do que ela era feita.




Jensen encontrou os amigos no refeitório por volta do meio-dia. Rylee, Emmett e Melissa sentavam de um lado da mesa. Freya e Trent sentavam do outro. Na mesa seguinte, estavam os meninos da Delta Beta Psi. Austin, David, Timothy, Sean, Gabriel e Boneta. Um grupo de meninas que estava de passagem parou e os cumprimentou.
— [...] Não se preocupe, pensaremos em alguma coisa... — Dizia Freya.
— O que? — Jensen sentou ao seu lado.
— A festa na Theta Kappa Theta para o feriado de páscoa — Contou Rylee. — Precisamos de um tema que vá além de sublime.
— Para beber e transar?
— E impressionar — Completou Melissa.
Em seu aparelho Rylee os mostrou o tema da festa de abril do ano passado. Jensen via mortos andantes, lápides, cadáveres falsos, comidas tradicionais de Halloween e fumaça cobrindo a pista de dança.
— Uma Zombie Parade? — Franziu a testa. — Vocês também dão festas hétero?
— Foi exatamente o que eu disse — Lembrou Trent.
Rylee virou para ela o visor.
— Eu gosto de zumbís. Em vez de devorar a sua alma, que nem faz o governo americano, eles o devoram com unhas e dentes.
— É, talvez em 2010 — Emmett espreguiçou-se.
— Por que não fazemos algo um pouco mais... étnico? — Freya sugeriu.
Jensen não prestou muita atenção na conversa depois disso, por ter notado uma estranha movimentação na outra mesa. Os estudantes aproximavam-se, olhavam para a tela dos celulares, olhavam de volta para ele e davam risada. Ele só entendeu quando uma das meninas retirou os fones. O refeitório inteiro ouviu sua voz, que dizia “Nathaniel Strauss, você é o meu céu”. O vídeo declaração que divulgou na Times Square há um ano e seis meses.
Seus amigos o encararam sem saber o que dizer.
— Deixe para lá — Emmett o segurou pelo pulso.
— Não! — Ele levantou.
E sem que ninguém esperasse, chegou na outra mesa e lançou em direção aos meninos a primeira bandeja a sua frente, pegando-a por baixo. Ovos, salada, salmão grelhado, risoto e cream-cheese voaram por toda parte. 
— Ficou maluco? — Austin se ergueu.
— Você não achou engraçado?
— Já chega, chamarei os seguranças... — Saiu andando.
— Faça isso! — Jensen gritou de volta. — Talvez aceitem se os chamar para uma daquelas surubas mensais na Delta House.
— Seu filho da puta! — Ele partiu para cima.
Foi aí que os portões do inferno se abriram. Jensen levou um golpe no maxilar, que o levou ao chão. Austin montou sobre ele e o acertou mais dois, antes de ele conseguir virá-lo de costas e tomar o controle. Emmett e Trent precisaram conter Timothy em seus braços para que não se envolvesse. Rylee e as outras meninas gritavam desesperadas por ajuda.
— O que está havendo? — O professor exigiu saber.  
— Eles vão se matar! — Rylee levou as duas mãos ao rosto.
A multidão gritava estarrecida.
Se Neil não o parasse a tempo, não imaginava o que Jensen seria capaz de fazer. Seus pulsos estavam encharcados de sangue – seu e de Austin. O outro garoto jazia desacordado no chão.
— Pare, agora! — O professor o continha nos braços.
— Ele é um maldito assassino! — Jensen gritava. — Ele matou Ryan! Ele matou um garoto inocente!
— Foi um acidente! — David gritou de volta.
Jensen estava tão determinado que conseguiu acerta-lo um chute no rosto, em um único pulo. O sangue escorreu em cascata pelo nariz de David.
— Já chega! — Decidira o professor.
Levou Jensen, contra a vontade, até sua sala. Não que um deles tivesse notado, Nick Levington, o irmão de Ryan, assistia tudo pela vidraça, de capuz erguido, suas mãos nos bolsos do casaco. Uma das meninas que passava pelo jardim perguntou se não iria para a aula de Estatística da Senhora Larter, pois acabara de tocar o sinal. Nick pediu, alto e em bom tom, que cuidasse da própria sua vida. Não perderia o espetáculo dos irmãos Delta por absolutamente nada.
Na sala do Professor, Neil usou de força para que Jensen sentasse em uma poltrona.
— O que você tem na cabeça? — Olhou-o de frente, suas mãos nos braços do assento. — Quer sofrer uma expulsão?
— Eu fiz o que precisava.
— Não, você pôs em risco seu futuro acadêmico por causa de um merdinha.
— Austin arruinou a vida de uma família inteira, deveria estar preso.
— Eu sei! — Neil suspirou.
Deslocou-se até a bancada, serviu-se de uma dose de whisky, contornou a mesa, sentou na ponta.
— O que acha que acontecerá agora? — Voltou a dizer. — Ele vai para o hospital, sua família presta queixa contra você, os aparelhos de Ryan são desligados mesmo assim e você perde um lugar nesta instituição. Que tipo de justiça infundada é esta?
— Eu quero que ele pague pelo que fez... — Jensen soluçava.
— Nos termos da lei, ele irá. Garotos desse tipo, que têm o mundo aos seus pés, caem na mesma proporção que se elevam. E muitas vezes por conta própria.
— Está dizendo que eu não devo fazer nada?
— Estou dizendo que precisa ser inteligente. Não poderá mudar as coisas se não estiver aqui.
Tem razão... sempre tinha razão. Jensen odiava isso.
Ergueu a cabeça ao alto, seguido de um suspiro.
— Como conserto as coisas?
— Acompanhe-me — Neil tomou à frente. — Eles saberão por você, não por ele.
— O que?
— Controle de danos — Abriu as portas. — A história é o que fazemos dela, se chegarmos primeiro.
Algo em seus olhos levou Jensen a pensar que ultrapassariam alguns limites. Quem diria?


Nada prendia sua atenção por muito tempo, ou despertava algum interesse. Estava entre o clamor da torcida, as câmeras, cartazes, os jogadores, o cheiro de pipoca e refrigerante, os carrinhos de comida, a vista da quadra, da forma que o jogo seguia arrastado, mesmo após seu time garantir uma pequena vantagem do segundo ao terceiro período.
De certa forma, havia mais barulho em seus pensamentos. Era difícil concentrar-se em uma coisa só.
— Vou pegar uma bebida — Disse a Bethany. — Quer alguma coisa?
— Uma Coca — Ela respondeu, antes dos gritos começarem.
No tempo em que ele levou para descer às arquibancadas, os Lions da Northview fizeram mais uma cesta de três pontos. Dominik caminhou de mãos nos bolsos e cabeça baixa.
A fila na cafetaria não estava tão grande, pois a maioria das pessoas não deixava o lugar durante a partida. Contudo, teve alguns problemas na hora de pagar.
— Não temos troco para cem — Informou a atendente. Valerie, dizia sua identificação.
Dominik procurou por entre moedas e fiapos nos bolsos.
— Posso pagar na segunda?
— Claro. É assim que funciona o capitalismo — Ela ironizou.
— Deixe comigo — Aproximou-se um garoto alto, forte, de cabelos loiros, que usava jaqueta de couro negro.
Dominik não achou que ele fosse realmente pagar até ver as notas em suas mãos.
— Você não precisa fazer isso... — Disse a ele.
— Acho que preciso, ou Valerie não o deixará ir a lugar algum.
— Não mesmo — Ela confirmou.
Talvez pelo sorriso que ele tinha nos lábios, seus olhos azuis, o tom alto e imponente de sua voz, que regava ao másculo e ao viril, Dominik sentisse uma estranha sensação de borboletas no estômago. Ultimamente isso acontecia mais vezes. Bastava olha-los nos olhos e ver que estavam olhando de volta.
— Tudo bem, eu... eu o pago na segunda-feira — Resolveu acordar.
— Não, estamos bem — Disse o rapaz, ao receber o troco. — Eu faço pelo carma.
— Sério?
— Se funcionar... — Deu de ombros, sorrindo.
Novamente as borboletas.
Thank you, man — Restou-lhe dizer.
Se bem que o olhar dissesse tudo.
— É, sem problemas — O rapaz o encarou. — Está aqui com os amigos?
— Sim — Respondeu Dominik. —  Na verdade, eles estão me esperando. Obrigado mais uma vez pelo...
— Carma.
— Isso — Tentou sorrir.
Dominik saiu andando, ele correu para alcança-lo logo em seguida.
— O que vai fazer no próximo fim de semana? — Perguntou o rapaz.
— Treinar, eu acho. A estadual de natação começa em duas semanas.
— Você está no time?
— Acabei de me mudar de Delaware. Entrei esse ano.
O outro assentiu.
— Meus pais viajam neste sábado, e eu estava pensando em dar uma festa para alguns amigos. Se não estiver muito ocupado, poderia passar por lá.
— À noite?
— Por volta das onze. Acho que seria uma boa oportunidade de nos conhecermos melhor... — Sorriu cortês.
Eles pararam a um passo de dobrar o corredor.
— Qual é mesmo o seu nome? — Dominik precisava perguntar.
— Ansel. Ansel Harleigh — Estendeu uma mão. — Temos aula de cálculo juntos.
— Certo... — O cumprimentou. — Eu realmente aprecio o que fez, ainda a pouco, mas agora não é um bom momento para mim. A competição começa em duas semanas, preciso treinar e estudar para os testes. E eu meio que... já estou saindo com alguém.
— É algo sério?
— Sim.
— Ah, ainda fazem isso — Ele parecia surpreso.
Dominik igualmente.
— Você não?
— Eu não sei — Respondeu Ansel. — Garotos são uma coisa nova para mim. Mas hey... — Afagou-o no ombro direito. — Posso respeitar isso.
Dominik agradeceu-o mais uma vez, ele começou a andar para trás.
— Vejo-o por aí? — Despediu-se o garoto.
— A gente se vê.


       Você alguma vez já se sentiu como a única pessoa em meio a uma multidão?
Dominik lembrou, involuntariamente, da noite em que conheceu Nate, no Strauss Capital Hotel. Seu mundo era tão pequeno que o dele foi capaz de engoli-lo por inteiro. Não havia mais ninguém, nada mais que pudesse querer. Ninguém competia em aparência, dinheiro e prestígio. Não os amavam e idolatravam à altura de Nathaniel Strauss. Não fodiam tão bem, a ponto de fazê-lo perder os sentidos. O que mudou? Nós mudamos?
Cerrou os olhos.
Sou um maldito egoísta. Um menininho imaturo, mal-agradecido do caralho, que não sabe a sorte que tem. Qual o meu problema? Não se diz não a Nathaniel Strauss.
Suspirou.
Devido à demora para voltar, Bethany se adiantou e comprou um saco de pipoca.
— Hey, onde estava? — Quis saber.
— Sinto muito, eu preciso ir agora — Ele entregou-a os dois copos.
— No meio do jogo? Dominik? — Ela gritou.
Mas ele já havia partido.

Quatro arenas de combate integravam o mesmo ambiente do salão de paintball indoor. A Zona de Guerra retratava uma cidade devastada por armas nucleares, com tanques de guerra, trincheiras artificiais, barricadas e até um helicóptero caído, ao centro. No Ferro Velho, encontravam réplicas dos modelos mais famosos de carros e motocicletas, perdidos em um labirinto de pneus.
O Clube Noturno era uma réplica quase exata do Jack Rabitt Slim’s, o bar/restaurante onde Uma Thurman e John Travolta dançaram juntos em Pulp Fiction – Tempos de Violência. Já o Parque Temático trazia elementos de algumas animações famosas, que competiam entre si. O castelo de brinquedos de Toy Story e o Castelo de Gelo de Frozen formavam as duas bases principais.
— Venha aqui, pequeno Gus... — Nate tentava atrai-lo.
O menino corria de um lado a outro, ali e aqui.
— Eu sei que tivemos nossas diferenças.... — Nate mirou a arma. — Mas estou disposto a perdoar, se você também estiver. Por que não falamos sobre isso frente a frente, feito homens?
— Não, papai! — O menino gritou.
Nate seguiu seu vulto para dentro do castelo. Passou um minuto, dois, três. Silêncio total. Quando Gus se virou, próximo ao parapeito, mal teve tempo de reagir. Nate atirou até seu pequeno uniforme de proteção ficar encharcado de tinta verde.
— Você é tão malvado... — Reclamou o menino.
Ao se ajoelhar, Nate o ajudou a retirar os óculos.
— Eu sou... — Confirmou com a cabeça.
O que não esperava é que Gus erguesse sua pistola e devolvesse todos os tiros.
— Você está morto! — Comemorava o menino.
Nate precisou sair correndo.
Depois do banho ele o levou a uma loja de brinquedos e comprou tudo o que pediu para ele e seus amigos. Depois o levou ao Mc Donalds e deixou que escolhesse o que quisesse. Depois, enfim, o levou de volta ao orfanato.
Eram dezoito e dezessete quando Nate voltou ao seu quarto de hotel. Dominik esperava-o sentado na cama.
— Hey — O cumprimentou. — O que faz aqui a essa hora?
— Eu acabei de voltar do jogo dos Lions.
— Algo aconteceu? — Sentou ao lado dele.
— Não, sinto muito. Eu só... eu preciso conversar sobre uma coisa. Mostra-lo, na verdade — Pegou o celular. — Eu gravei isto no dia em que fomos ao Lavish Resort.
O vídeo mostrava um momento íntimo deles dois, em uma das suítes presidenciais. Beijavam-se. Lambiam-se. Rangiam a cama. Nate sempre por trás.
— Por que? — Olhou para ele.
— Eu não sei mais. Não sei do que tinha medo, o que achava que iria acontecer. Isso não importa mais — Clicou para apagar. — Já era.
Nate foi do celular nas mãos dele aos seus olhos azuis.
— Você planejava usar isso contra mim?
— Não. Eu só queria ter uma vantagem.
— Para o caso de...?
— Para o caso de algo acontecer. Mal nos falamos nas últimas semanas, Nate. E eu sei que você percebeu que eu estava distante. Achei que você podia, sei lá... achei que você...
— Daria o troco — Nate entendeu. — Mas para isso, eu precisaria de um motivo. Eu tenho um motivo?
Dominik não respondeu imediatamente.
— Há alguns dias, eu fiz uma coisa... — Começara a dizer.
— Você fodeu alguém — Deduziu Nate.
O olhar de Dominik dizia tudo.
— Aconteceu no colégio, após do treino. Eu não sabia como contar.
Nate levantou da cama e caminhou até a vidraça, com pôs as mãos na cintura.
— Sabe o que eu acho? — Virou de volta. — Acho que pensou em tudo. Você sabia que era só uma questão de tempo até o que aconteceu na sua festa de aniversário se repetir, por isso gravou o vídeo. Transou comigo hoje de manhã, nesta cama, para tentar descobrir se poderia guardar este segredo e continuar ao meu lado. Agora me diz a verdade, pois sabe que não seria capaz — Avançou um passo. — Há quanto tempo está pensando em terminar comigo?
— Eu não quero terminar, mas não podemos continuar assim.
— Fodendo outras pessoas e mentindo sobre isso, você diz?
— Não seja ridículo, Nate. Eu tenho dezesseis anos. Não sei nada da vida, ainda não fiz o que quero, não conheci lugar nenhum além da casa dos meus pais e o seu mundo. Não acha que eu deveria aproveitar um pouco, antes de me prender a alguém?
Um sorriso despontou nos lábios de Nate.


       — Você se sente preso a mim — Era uma afirmação.
— De forma alguma. Só quero ver o que há lá fora, descobrir coisas novas, nem que seja para quebrar a cara e saber o que estou perdendo. É tão difícil de entender?
— Não... — Desviou o olhar. — Sempre quis que você tivesse tudo, que pudesse se encontrar. Só achei que aconteceria comigo ao seu lado.
— Eu também... — Desviou o seu.
Fez-se silêncio total por um momento.
— É melhor você ir, tenho uma reunião agora — Nate pretextou.  
— Tudo bem, aqui está o celular... — Estendeu-o.
— Não, fique com ele. Vai precisar durante o castigo.
— Okay — Guardou de volta. — Obrigado.
Foram sete passos contados de Dominik até a porta. Fora tentando não olhar diretamente para ele que Nate sentou à beira da cama, tirou sua gravata e encarou a parede.
— Apesar de tudo, Nate... — Sussurrou Dominik. — Eu sempre estive ao seu lado. Sempre amei você.
— Mas você nunca foi meu — Refletiu Nate. — Parte de mim sempre soube disso.
Naquele momento, Dominik perguntou-se o que ele estaria pensando. E o que Nate estava pensando é aquela seria a última vez em que acreditaria.


Eles puseram fones de ouvido por baixo do capuz de Mia. Bang Bang, de Nancy Sinatra, começou a tocar.

I was five and he was six... eles a levaram.
We rode on horses made of sticks... ela entrou na sala de bonecas.
       He wore black and I wore white....
retiraram o capuz.
       He would always win the fight....
sorriram para ela.

Bang bang, he shot me down... vestiram-na peça por peça.
       Bang bang, I hit the ground...
arrumaram seus cabelos.
       Bang bang, that awful sound...
a maquiaram.
       Bang bang, my baby shot me down...
uma lágrima escorreu.
Ela fechou os olhos e respirou fundo.

Atacou primeiro o homem de colete azul, arrancando parte de sua orelha com os dentes. O de colete roxo ela empurrou sobre as máquinas de costuras. O homem derrapou sobre a mesa e bateu a cabeça contra a parede.
— Sua piraninha! — Um dos guarda-costas a agarrou por trás.
Ela gritou e esperneou em seus braços.
— Não!
— Cala essa boca! — O outro a derrubou com o cacetete.
No chão eles a acertaram com socos, chutes e bofetadas. Ela foi arranhada, xingada, despida, sufocada. Teve a cabeça batida contra a madeira várias vezes, além do rosto marcado por sangue e hematomas. Não demorou muito até perder os sentidos.
Acordou horas mais tarde em sua cela, coberta de lama. Sentia a dor atingir-lhe por toda parte; pernas, braços, rosto, seios, abdome. Não podia se mover, não respirava bem. Se o plano desse certo, terá valido à pena.
— Ah, Mia... — Noah lamentou.
Ela viu um par de botas negras se aproximar.
— Até quando fará este jogo? — Disse também. — Bom, foi escolha sua. Cuidem dela, senhores — Deu a última ordem.
Ela esperou em silêncio.
Assim que eles saíram, cuspiu em sua mão a pinça de sobrancelha que escondera atrás da língua, durante o atrito. Seu passe e o de Hannah para o mundo lá fora.

O celular de Dae tocou sobre a cama.
— Alô?
— Gahl Dae-Hyung? — Perguntou uma voz.
— Sim. Quem fala?
— Me chamo Colin Fraser. Tenho uma proposta para você.
Uma que não recusaria por nada.

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   6x09: I Told You, He Only Thinks About Himself (11 de Junho)   
   Mia está cada vez mais perto de sua liberdade. Semana que vem, veremos se ela consegue. E o que Nate fará agora que descobriu em Dominik um pouco de si mesmo?

Nathaniel Strauss para o New York Models (2020)
Só faltou os olhinhos verdes rs
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