Livro | The Double Me - 5x11: Just a Little Capitalism, Bitch!
5x11: Just a Little Capitalism, Bitch!
“A câmera é uma arma".
Sou eu, Nate. Tive um sonho ontem à noite que me fez pensar.
Estava preso à uma estaca, no alto de uma fogueira medieval. Pessoas acusavam-me
de ser uma bruxa enquanto cachorros latiam, sinos entoavam ao longe e o fogo
queimava intenso sobre carnes e ossos. Muito Hollywoodiano, eu sei. Meu
psiquiatra entende como lapso de regressão, e diz que talvez eu não tenha
jogado feitiços em brancos e heterossexuais de forma muito discreta em outra
vida. Não tive escolha senão acreditar, pois isso soa como algo que eu faria.
Passei o resto da tarde assistindo Coven e estimulando as identificações
simbólicas que encontrei. Dominik não me saia da cabeça, pra falar a verdade. Não
lembro a última vez em que fiquei tão curioso por alguém e fui tão dedicado a garantir
um segundo encontro. O sexo foi... transcendental; esta é a palavra certa. Eu
nem sabia que era possível gozar a seco e ficar as próximas horas sentindo o
sangue correr pelo pau feito heroína. E perdi as contas das punhetas que bati
pensando nisso só hoje.
Combinamos de não trocar números ao final do dia, pois seria fácil demais
para nos encontrarmos. Aí começou meu verdadeiro desafio.
Procurei na internet, nos jornais e em revistas. Fui da Times Square ao
Upper East Side, e de Manhattan aos Hamptons. Nada. Achei que o veria sair por uma
porta ou cruzar a janela de algum residencial; nada. É até engraçado admitir. Quer
dizer, boa sorte encontrando uma única pessoa em uma
cidade com mais de oito milhões de habitantes da próxima vez.
Foi quando me veio à mente: Seu pai estava no Strauss Capital Hotel, na
noite em que nos conhecemos. Checando as filmagens, bastou compara-lo às fotos
nas revistas. Fico até ofendido por não ter pensado nisso antes.
Dominik Belmont, filho de Mark e Rachel Belmont, e herdeiro secundário da
Fellon Industrial, empresa iniciante no ramo da construção. Tem um irmão mais
velho chamado Elijah, que seguiu carreira militar, assim como o pai, e uma avó por
parte de mãe vivendo no sul da França. Finalmente algo que temos em comum, mas
isso não me deixa menos motivado a seguir com o plano.
Minha vez de stalkear você, Dominik Belmont.
Um sorriso despontou nos lábios.
Rachel o recebeu na mansão Belmont ao
fim da tarde, sob o pretexto da boa vizinhança – e de ser tão rico que ela não
poderia resistir. Tomavam juntos chá gelado e dividiam histórias de viagens
malfadadas quando Dominik os flagrou, na sala de estar. Seus lábios foram a um
tom de palidez como era o da pele.
— Oh, querido! — A mãe sorriu-lhe. — Como foi a
natação?
— Eu... foi... okay...
— Um amigo veio visita-lo — Fez sinal com os
olhos.
Nate sorria para ele como se prestes
a destruir sua vida.
— Pensei que o encontraria mais cedo em casa. Você
nada?
— Ele não disse? — Rachel se precipitou na
resposta. — Dominik foi medalha de ouro quatro vezes durante o ginásio, assim
como o irmão — Escondia um sorriso orgulhoso detrás da porcelana da xícara.
Dado a seu porte físico, Nate imaginou que ele
praticasse esportes. Bom que chegara a tempo de vê-lo de camiseta molhada e
short de treino... sem cueca.
— Meu amigo, Thayer, é um medalhista olímpico.
Vocês teriam muito o que conversar — Nate plantara uma armadilha. Observou,
observou e observou, até que ele ficou vermelho.
Culpado; o filho-da-puta-zinho
assistiu nosso vídeo íntimo.
— Deve ser encantador — Rachel repousou a
xícara sobre a mesa. — Querido, por que não troca de roupa e junta-se a nós?
— É claro... — Uma ideia lhe veio à mente. — Mas
estou cheio de dever de casa. Alex poderia me ajudar — Virou para ele, uma mão na
alça da mochila.
Nate soltaria uma gargalhada se não fosse tão
comprometido com a atuação.
— Farei o que puder — Levantou-se então. — De
que matéria estamos falando?
— Matemática.
— Sempre ela. Se me permite... — Pediu à
anfitriã.
— É claro — Ele nem precisava perguntar.
Dominik o levou para além do corredor estreito
e a passagem do escritório. Duas bananeiras artificias resguardavam cada lado
da escadaria principal, ao longo da curva, com um lustre de cristais
pontiagudos pendendo sobre uma mesa de vidro entre elas. No segundo andar, um
sofá sem recosto oferecia a vista do parapeito envidraçado para o jardim da
propriedade. As paredes eram cinza e camurça, o piso em losangos de preto e
branco, refletindo a ornamentação.
Nenhuma
palavra foi dita até que eles estivessem longe dos empregados que circulavam acima
e abaixo. Nate o puxou para dentro de um banheiro sem dar-lhe escolha.
— Surpresa!
— Beijou-o apressado.
— O que está fazendo aqui?
— Efetivando o segundo encontro.
— Você precisa ir embora antes que meu pai
chegue.
— Não seja dramático — Beijou-o outra vez.
Dominik sentia o ar lhe faltar aos poucos.
— Nate, você não pode ficar aqui.
— Não sabe o quanto foi difícil encontra-lo...
— Deslizou as mãos sobre a traseira da calça. — Procurei em toda parte, até na
minha imaginação... — Mordiscou-o abaixo do queixo. — E passei as últimas
quarenta e oito horas me acabando na punheta porque você não estava lá... — Sentia-o
duro e pulsante contra o corpo. — Olha o que está fazendo comigo... É tudo
culpa sua.
— Por favor...
— Diga sim e eu serei o homem mais feliz do
mundo. Diga sim, diga sim... — Beijou-o no pescoço e na bochecha.
Do pouco que Dominik poderia resistir, Nate
nunca lhe era o caso. Pensou nele na mesma intensidade, com a mesma obsessão,
de revirar os olhos e suar embaixo dos lençóis.
— Sim... — Respondeu, ofegante. — Me fode.
Nate sorriu perverso.
Virou-o primeiro de costas, contra o espelho. Arrancou
seus shorts com um puxão e pôs para fora pela abertura do zíper.
— Now
relax and think of Harry Potter — Disse, estocando a primeira.
Dominik sentia-o fungar em sua nuca como uma
brisa quente e extenuada. A dor foi precisa, alargando a pele traseira, mas de
um agradável que só cabia a ele, e pouco a pouco a melhorar. Uma das mãos
segurava-o no ombro esquerdo, para mantê-lo imóvel; a outra fazia-o lamber seus
dedos.
— Fique quieto — Nate sussurrou.
Mas a Dominik era impossível. Cada estocada
deixava-o mais perto de seu ápice sem que ele ao menos o tocasse onde deveria.
Nate, firme com os braços, levantou-o sobre o mármore
da pia. Suas testas se uniram entre suor e cabelo molhado; seus movimentos
faziam tremer o espelho, mais e mais rápido. Coube a Nate tapar sua boca com
uma das mãos, para evitar os gemidos, e Dominik a revirar os olhos e corar as
bochechas como se o ar lhe faltasse aos pulmões.
De quase instantâneo foram ao alívio. Dominik
espirrou sobre a jaqueta de Nate, seu queixo e uma sobrancelha, também com um
pouco a escorrer sobre os testículos. Nate o fez enquanto estava dentro.
— Nada mau para um segundo encontro — Nate passou
uma tira de papel higiênico sobre as áreas afetadas. — Te vejo depois, melhor
amigo — Um selinho foi de despedida.
Rachel esperava-o ainda na sala de estar,
junto ao álbum de recordações do qual o dissera. Algo lhe chamou atenção quando
ele sentou.
— Tem alguma coisa... — Ela fez sinal com o indicador.
Nate esquecera um gotejo insignificante no
bolso esquerdo da jaqueta.
— É sabonete líquido — Desfez com um dedo. — Tomei
a liberdade de ir a um dos toilets, no
caminho de volta.
— Acontece o tempo inteiro.
Então eles
tinham sabonete líquido, era uma
boa mentira.
— Posso mostrar agora o Livro de Recordações
da Família Belmont? — ela tomou o lugar ao seu lado. — Sei que não fazem mais
isso, mas não posso evitar em ser das antigas.
— Não, é realmente adorável.
— Este é Dominik com dois anos de idade —
Apontou.
Nate via um montinho de gente de cabelos
loiros com a boca suja de chocolate e o pijama listrado do Capitão América. Lembrava
Gus, talvez, ou tudo o lembrasse por sentir sua falta.
— Ele era uma gracinha — Sorriu ao dizer.
Nem todos foram
feitos para ser pais. Nate, em
particular, nunca achou que o seria. Uma criança no mundo era outro em meio a
guerras, a dor e ao ódio, e não bastava a escolha que nunca fez de estar ali.
Mas as coisas haviam mudado. O mundo não seria
um obstáculo, se lhe fosse proteger. As pessoas não seriam um obstáculo, se as
mantivesse longe. Temia, ao invés disso, que o destruísse com as próprias mãos.
Que o fizesse infeliz, que lhe fosse uma vergonha, que tomasse o controle de sua
vida e o fizesse odia-lo por isso. Nate sabia o bastante sobre abusos paternos
para temer que não fosse diferente, se tivesse a chance.
Meu filho
seria feliz ao meu lado? – Era o mais
importante. Não sou feliz eu mesmo,
comigo.
As páginas foram virando e deixando as fotos
para trás.
Do lado de fora, Lexi registrava a pequena
reunião no celular. Nada que pudesse usar, ainda. Bastava ter uma oportunidade.
൴
Estavam tocando a sua música no primeiro ambiente. Break the Rules, Charli XCX. Alex reconheceria em qualquer lugar.
Desceu as escadas, cambaleando, para o centro
da pista. O piso era de blocos retro iluminados que acendiam de uma cor
diferente ao contato direto. Sob a movimentação das luzes, do alto de globos espelhados
às escadarias laterais, os tons entravam em mistura debaixo de seus pés. Havia
ainda armações gradeadas de ferro branco e em formato de jaula para cada
dançarino exótico no salão. Quatro delas cercavam a pista de dança nos quatros
cantos do quadrilátero; A tigresa, a mulher-gato, o bombeiro e o surfista; confinados
e despidos.
Alex não levou muito tempo até sentir-se em
casa. Dançava na pista, seguia o trajeto das luzes com os olhos, jogava água
sobre o próprio rosto, imaginava-se sozinho, como realmente gostaria – e
acreditava nisso até abrir olhos novamente para a multidão incessante.
Em determinado momento, as luzes e as batidas
fizeram um pouco mais que fascina-lo. Um ponto em vermelho relevava, em
desfoque, um homem robusto de dois metros de altura, com uma camiseta regata e bermuda
bege. A tatuagem em seu braço lhe chamou a atenção; não estava lá quando o
conhecera, pois tinha certeza que o conhecera.
Brett Smith. Seus olhos fulminavam.
— Não você... — Alex sussurrou.
A visão seguia-o a passos lentos através da
multidão, não importava o sentido. Alex convencera a si mesmo de ouvir o
estrondo de suas botas tocarem o chão e de sentir o corpo estremecer pela força
do impacto, como se ele tivesse a força de um exército inteiro.
— Alguém me ajude! — Gritava por onde
passasse.
Quando seus passos excederam a pista, ele caiu
sobre uma pirâmide de taças de vinho. Os seguranças da boate se prontificaram à
retirada.
— Americanos estúpidos! — Um deles o agarrou
pelo braço.
Alex não poderia ligar menos para a decoração
extravagante, assim vos disse.
Foi jogado sobre uma poça de lama, na calçada,
com uma taça vazia para quebrar sobre o pavimento. A diferença era mínima entre
o lá e o cá. Tinha uma conta no banco com mais de quarenta milhões de dólares,
por cortesia de Cameron Ridell, mas partilhava da brisa gélida da noite de Toronto
em meio aos insetos.
Brett havia
desaparecido, com isso poderia
contar.
Abaixo de suas pernas a água refletia os
letreiros da Uniun Nightclub em roxo
neon. Não lhe era má ideia ser dono de uma boate e ter todas as noites como uma
festa alucinante. Conhecer pessoas novas, acompanha-las por onde se perdem.
Perder-se também, para acabar sentado numa poça de lama, na calçada. Quarenta
milhões tornaria quase tudo realidade. Quase
tudo, se fosse criativo.
Levantou do chão, tirou o excesso de poeira de
roupa e começou a andar. Um carro prestes a deixar o acostamento o acertou em
cheio enquanto atravessava a rua.
— Ai meu Deus! — A motorista correu até ele. —
Você está bem? Não o vi chegar, eu sinto muito!
— Táxi?
— Sim...?
— Okay, leve-me para casa — Pôde sentar
sozinho.
— Como é?
— Leve-me para casa, é o seu trabalho.
Ela havia pensado em um hospital, talvez a
polícia, devido às circunstâncias. Era melhor fazer como ele pedia.
— Eu o ajudo... — Volteou um braço dele sobre
seus ombros, para assim carrega-lo até o banco de trás. — Você está bem, nada
aconteceu. Você está bem... — Dizia e abancava o cinto de segurança em volta
dele.
Alex esperou que ela entrasse no carro para
perguntar.
— Você tem TOC?
— Eu? — Seu inalador fez um barulho
excruciante. — Você me pegou.
— Tente se acalmar. Eu não me machuquei, você
não cometeu nenhuma infração e agora faremos uma corrida, como tem feito a
noite inteira. Nada pode dar errado... — Mas era cedo demais para dizer.
Um time de paparazzi cercou-os por todos os
lados em busca da jovem de cabelos loiros que acabara de invadir o táxi. Muito
do que ela levava consigo era uma estratégia de fuga, vide o espaçoso casaco de
raposa silvestre, os óculos escuros e a bolsa de cor neutra, que vendiam no
mercado de pulgas a dezenove e noventa. Por baixo usava um vestido bordo, de
gala, decotado nas pernas. Somente isso lhe fazia sentido.
— Dirija! — Ela jogou notas de cem sobre a
motorista.
Uma paparazzi ficou com a cabeça presa pelo
lado de dentro quando ela içou as janelas. A jovem a atacou com as pastilhas de
gengibre que levava nos bolsos.
— Ai meu deus! — A mulher engoliu sem querer.
— O que você me deu? O que você me deu?
— Só um pouquinho de capitalismo, vagabunda! —
E a socou no rosto.
Agora não estava mais presa; lambia, no chão,
os sapatos dos colegas.
— Dirija! Dirija! — Alex gritou à motorista.
Ela inalou uma última vez, por precaução. Os
flashes foram deixados para trás a medida que avançavam. Até paparazzi se cansam, Alex pensou. Era difícil dizer o que a
jovem moça estava pensando por trás dos óculos escuros.
— Emma Roberts, sobrinha de uma linda mulher —
Ela estendeu uma mão. — Estou brincando, odeio essa piada.
— Nate Strauss — Se o irmão podia, ele também
podia.
— É claro, dos hotéis Strauss, em Nova York. Toronto
é cheia de surpresas.
— E você é da TV. Belo disfarce, a propósito.
— Obrigada. Roubei de um set.
— Scream
Queens?
— Exatamente. E obrigada a Ryan Murphy — Retocava
o batom no espelho traseiro.
Não deixara de notar o olhar assustado da
motorista no banco da frente. Havia um nome para isso em Hollywood: Stage Fright. Se estivesse sorrindo,
chutaria Estocolmo.
— Não se preocupe, querida. Você foi ótima — Guardou
o batom de volta na bolsa, junto aos óculos. — Então, para onde estamos indo?
— Ainda não decidi — Alex respondeu. — Está hospedada
em algum hotel nas redondezas? Poderíamos leva-la até lá.
— Seria o primeiro lugar onde me procurariam.
— Certo, o culto de paparazzi... — Não sabia
se era uma boa ideia perguntar.
— Conheço o lugar perfeito. Você pode vir, se
quiser.
— Somos amigos agora?
Ela riu.
— Não, somos duas pessoas que se encontraram
em Toronto e podem sair juntas sem desconfiar que um de nós é um serial killer
disfarçado — Mimicou apontando para a motorista. — E você é uma celebridade
LGBT, não há companhia melhor.
— Assistiu aos vídeos?
— Não, eu sempre sei — Mimicou novamente.
Alex não entendia ao certo. A motorista também era gay?
— Se faz questão de se divertir com um
desconhecido das revistas, estou dentro. Você é uma desconhecida da tv, para
todos os efeitos.
— Então seremos desconhecidos juntos.
— E o que desconhecidos fazem?
— Bebem até se tornar melhores amigos. Vire à
esquerda, na Bay Street — Ela pediu à
motorista. — Você vai amar esse lugar desconhecido.
൴
Uma vez o contaram sobre os sonhos lúcidos. Jensen
os tinha desde pequeno, sem dar-lhe uma definição apropriada. Dizia aos pais
que sempre sabia que estava em um sonho e isto o possibilitava a explorar a
imaginação para além de sua realidade. Por isso, talvez, eram raros os momentos
em que sonhava. A natureza manteria o equilíbrio de uma forma ou de outra.
Com o passar do tempo foi notando a ambição precingia
o subconsciente. Uma das técnicas mais eficazes para alcançar a lucidez consistia
em pintar um A de Acordado, em caneta preta, sobre a
palmas das mãos – ou em qualquer outro lugar estratégico e de fácil acesso. O
portador precisaria questionar sua realidade sempre que visse a marca, para então
mandar uma mensagem indireta ao cérebro e promover a repetição durante o sonho.
Em outras palavras, questionar a realidade seria a melhor forma de alcançar um
sonho lúcido.
Aquele era o primeiro a se lembrar após meses
no escuro. Jensen estava ao seu lado, depois não mais. A multidão festiva o
engolia para mais distante.
— Não posso vê-lo! — Gritou, abafado.
Nate virou para ele, os olhos verdes como duas
pedras preciosas. E o resto do mundo em preto e branco, naturalmente.
Foi quando ele acordou. Tinha um livro de
engenharia escorado à testa e uma caneta entre o indicador e o anelar.
— Fuck...
— Olhou para o relógio na parede. Mais
que atrasado, quase um cadáver
universitário. — Oh, Fuuuuuck! — Requeria
xingar mais alto.
Vestiu as calças, colocou um suéter, organizou
os livros na mochila e seguiu para o auditório. A multidão o encarou em
silêncio quando passou pela porta, o que incluía o Professor Neil Baumann. Era
um homem de no máximo quarenta anos de idade, com barba loira por fazer e os
cabelos semi grisalhos, de óculos de grau e blazer escuro. Bonito, sem dúvidas;
logo, intimidador.
— Quarenta minutos depois, ele está aqui — Disse,
zombando.
— Sinto muito, perdi a hora.
— É, eu ouço muito isso.
— Posso sentar?
Ele pensou a respeito.
— Na verdade, por que não se apresenta à
turma? Adoraríamos conhece-lo melhor.
— Está falando sério?
— É claro. Todos nos conhecemos, mas você
chegou por último. Venha até aqui — Sentou-se na ponta da mesa, o ponteiro
sobre o ombro esquerdo.
Jensen podia ouvir cada risada abafada ao
longo do auditório. A caminhada foi um desafio.
— Quando quiser — O professor permitiu.
— Olá, me chamo Jensen McPhee. Sou de Hamptons,
Nova York, e tenho dezenove anos. Recentemente fui admitido pela Delta Beta Psi, a mesma fraternidade de
meu pai, Patrick McPhee. Gosto de música eletrônica, esportes radicais, pizza
doce e dormir pelado. Sou gay, a propósito. E fodo no primeiro encontro.
Um lado do auditório fez-se em histeria, o
outro observava envergonhado. Uma jovem de dreads, na sétima fileira, cuspiu um
jato de água sobre os que sentavam à frente.
— Senhor McPhee... — Chamou o professor, em
meio a risadas. — Somos muito agradecidos por compartilhar sua intimidade.
Sente-se, por favor.
Jensen agradeceu mentalmente.
O lugar ao lado de Trent Maddox parecia mais
convidativo que atravessar o auditório e tomar uma das últimas cadeiras. Não o
vira desde o brunch de dois dias
atrás. Nove mil quinhentos e trinta e três dólares para sentar em uma mesa fora
do campus e ficar tímido demais para beija-lo.
— Excelente performance — Trent brincou.
Não era impressão que seus cachos cor de ocre aumentaram
em volume. Naquela tarde, estavam particularmente sedutores.
— Não é um balcão da Delta Beta Psi — Jensen organizou as apostilas.
— Eu pagaria nove mil dólares para ouvir
alguém dizer o mesmo ao Senhor Baumann.
— Ele já fez isso antes?
— Fui eu da última vez. Sabia que não é
permitido dormir no auditório?
— Nessa eu fico do lado dele.
Trent sorriu.
— Ele é um cara legal, na maioria das vezes.
Só não tolera o descumprimento das regras.
— Seria misericordioso se apenas nos expulsasse.
E como uma ironia, ouviu o toque de seu
celular. O professor os alertara mais uma vez sobre os aparelhos desligados.
— Cuidado com o que deseja — Trent riu por
último.
A palestra continuou por mais uma hora de
tempo. Eles pouco conversaram no decurso de exercícios, ou coisa alguma. Jensen
levava tempo demais para concluir os cálculos e Trent perdia por não traçar uma
reta ajustadamente no caderno de desenhos. Um ajudava o outro, dependendo do
que precisassem – quando o professor fingia não estar olhando.
Terminou às dezessete em ponto.
— Posso dar uma palavrinha, Senhor McPhee? —
Pediu o professor.
Ele caminhou contra a multidão.
— Sei o que vai dizer. Sou um desses alunos
que não leva a sério a vida acadêmica e precisa de comprometimento, mas o que
aconteceu hoje nunca vai se repetir. Acabei de ser admitido em uma fraternidade
e ainda estou tentando conciliar os horários.
— Tome — Entregou-lhe um livreto.
A capa mostrava uma pirâmide de cartas de
baralho em um fundo branco. Sobre elas, o título: Structures or Why Things Don’t Fall Down.
— É uma punição? — A Jensen soava como tal.
— É uma oportunidade. Prove-me que estou
errado.
— Então não me dispensará de sua classe?
— Exatamente — Assentiu. — Você tem exatos
quarenta minutos.
— Então é uma punição — No fim das contas.
O professor virou para a lousa.
— Não se você gostar — Escreveu sobre a lição,
em letras de forma, e virou de volta. — Já ouviu falar em sonhos lúcidos? Faremos
um.
൴
Eles foram primeiro ao Orchid NightClub, na 82 Peter
St.
Beberam, dançaram, cantaram e flertaram. Foram
da pista ao camarote, e de lá ao terraço, e até a passarela de metal, erguida
sobre os dançantes. À meia noite não havia mais o que explorar, exceto por Toronto
como um todo.
— Eu tenho uma ideia — Emma tomou-o pelos
braços.
A motorista esperava-os no banco da frente em
um sono profundo. Durante o trajeto, Alex pediu que abrisse o teto para
protagonizar sua própria cena de filme.
— Motherfuuuuuuuckers!
— Gritava ao vento, uma garrafa de vodka em mãos.
Emma também tivera a chance de protagonizar
uma cena de filme. Havia uma brincadeira nos sets, sempre antes de gravar, na
qual tratava os colegas de acordo a seus personagens mais marcantes na TV. Alex
teve um pequeno vislumbre de Chanel Oberlin enquanto pagavam pelas bebidas, na
saída da boate, mas percebia grande potencial no jogo para se expandir.
A ideia era trazer Madison Montgomery de volta
dos mortos, mas na pele da própria Emma Roberts, em uma festa de gala. Alex
ficou olhando de longe as apresentações.
— Oi, eu sou Emma Roberts, estrela de cinema —
Ela dizia.
— Oi, eu sou Emma Roberts, mas isso você já
sabe. Eu sou famosa.
— Oi, eu sou Emma Roberts, namorada de Evan
Peters.
— Oi, eu sou Emma Roberts. Evan Peters é tão
lindo!
— Oi, eu sou Emma Roberts. Uma vez soquei Evan
Peters no rosto e ele me mandou para a cadeia.
Alex cuspiu sua bebida quando ouviu a última
frase.
Saindo da festa, ele a levou a um clube privado
no centro da cidade, onde realizavam jogos de pôquer. Cinco homens carrancudos de
terno e gravata faziam a mesa redonda naquela noite contra duas prostitutas de
espartilho e perucas Chanel cor de rosa. A Emma lembrava todos os filmes de
máfia que já assistiu; a Alex, um clipe de Christina Aguilera ou Madonna,
ambientado nos anos vinte.
Havia espaço
para apenas um deles ao lado dos jogadores.
— Se vencer, compre-me um casaco novo — Emma
quis dizer boa sorte.
Na primeira rodada, Alex perdeu
propositalmente como estratégia.
Na segunda, não tão proposital.
Na terceira e na quarta, ganhou de lavada.
E chegava a quinta acumulando o valor de
trinta e sete mil dólares em fichas. Era isso que incomodava os outros
competidores, ou o forte cheiro de bebida em suas roupas.
— Casaco novo, casaco novo, casaco novo — Emma
entoava uma oração para a última rodada.
O homem de roxo mostrou suas cartas primeiro, depois
ele. Full House contra um Four of a Kind; vitória de Alex.
— Você conseguiu! Você conseguiu! — Emma
gritava sem parar.
E Alex segurava as fichas como as fosse ninar.
Quanto ao perdedor, restou os xingamentos em
outra língua. Mandarim? Japonês?
Cantonês? – Alex não saberia dizer. Era
racismo sugerir todos esses idiomas só por que ele era oriental? – Só
importava os noventa e sete mil dólares.
— Vamos comprar seu novo casaco — Disse, por
fim.
Não havia uma loja grife aberta naquele
horário, então tiveram de se contentar com um modelo de segunda mão quatro
dígitos mais barato e em um tom mal propício de alaranjado. Emma exibia-o
elegante por sobre o traje casual, até os joelhos, enquanto caminhavam sobre a Ponte Humber.
Neve ainda cobria a maior parte da vegetação
ao redor, contrariando o fim do inverno. No céu quase não se via estrelas –
talvez para além do panorama urbano.
— Só um pouquinho de capitalismo, vagabunda. E
bang! Murro na poc — Alex imitou com
os punhos.
Emma se contorcia de tanto rir.
— Foi legítima defesa — Lembrou a ele.
— A moça estava com a cabeça presa na janela
do carro. Como pode ter sido legítima defesa?
— A câmera é uma arma, assim como a fofoca.
— O que aconteceu, por falar nisso?
— Eles apareceram durante a première, algo
sobre fotos vazadas na internet. Afirmei que eram todas montagens, até pelas
marcas de nascença embaixo das axilas, mas explique isso a um diretor de cinema
que precisa dos tabloides cobrindo sua grande estreia, não a vida pessoal das
atrizes. Tivemos uma briga catastrófica na frente de todos. Talvez eu tenha
jogado uma taça de champanhe em seu rosto — Arregalou os olhos só de lembrar.
Alex teria feito o mesmo, pela mesma razão.
— Muito Chanel da sua parte.
— Eu sei.
— Então só está aqui por essa noite? — Tomou
um gole da garrafa de vodka.
— Tecnicamente, sim. Recebi uma proposta em Los
Angeles.
— Cinema ou TV?
— TV. Cruzes os dedos — Fez para que ele visse.
— E você, vive aqui há muito tempo? — Chutou um bloco de neve em seu caminho.
Alex estipulara de antemão até onde iria sua
verdade.
— Há uma semana — Respondeu. — Antes disso
servi no exército.
— Deve ter muitas histórias a contar.
— Não sobre o garoto certo — Sorriu
envergonhado.
— Pode falar sobre isso, se quiser. Não
estarei aqui para julga-lo na manhã seguinte.
— É a bebida falando...
Ela o bateu de ombros amigavelmente. Suas
roupas fediam a vodka, mas seu hálito era de um urso polar.
— Você sabe que quer — Sorriu para ele. —
Diga-me seu nome.
— Thayer.
— Diga-me o que ele fez.
— Terminou comigo.
— Por quê?
Essa não era a verdadeira questão. Alex sabia
os motivos; poderia enumerá-los em ordem crescente e lhe dar a merecida razão. O que tirava seu sono era saber que só
havia amor para quem ele foi, não para quem se tornara.
— Cometi muitos erros — Disse a ela. — Há um
limite estabelecido até que alguém não possa mais perdoa-lo.
— Você perdoou a si mesmo, ou espera que
Toronto o faça esquecer?
— Você é incrivelmente perceptiva.
— Reconheço um roteiro de drama quando vejo um
— Exceto pelo último papel em In a
Relationship.
À frente não havia mais trilho, então deitaram
sobre a neve no acostamento. O céu era de um lilás anuviado e coberto de
flocos. Caíam em seus rostos, derretiam sobre a pele e escorriam como lágrimas.
— Você o ama? — Emma perguntou.
— Mais que qualquer outra coisa.
— Então encontrará seu caminho de volta. Little Italy, página oitenta e três.
— Queria que minha vida funcionasse como um
script — Suspirou.
De alguma forma, isso lembrava a ela seu
estômago vazio.
— Estou com fome — Disse.
— Okay, let’s
eat some brownies.
Next...
5x12: They Say I'm Crazy (13 de Janeiro)
Feliz Ano Novo! Vou fazer o possível para continuar postando em dia, faltam só mais 7 capítulos para terminar a temporada.
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