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Livro | The Double Me - Prólogo Livro 3 + 5x01: Hell is a Teenage Girl [+18]


ATENÇÃO! Os capítulos a seguir, pertencentes a 5ª Temporada de The Double Me, fazem parte do terceiro livro da saga, chamado The War of Ours. Optamos novamente por dividir o mesmo livro em duas temporadas para se adequar aos padrões de postagem do Meu Mundo Alternativo.

Prólogo
“Para a maioria dos homens, dor significa ódio. E ódio significa vingança”. — Paolo Mantegazza.

Seus dedos a tocaram de forma incisiva. O colar de âmbar fora parar em suas mãos um segundo antes de ver a garota atravessar a janela do segundo andar.
Gwen engatinhou até a beirada, entre cacos de vidro serigrafados. Uma poça de sangue expandia-se gradativamente sobre as escadas principais, contrastando o rubro intenso ao azul celeste dos olhos estáticos da garota. Estava morta; seu crânio dividiu-se em dois.
O que eu fiz? Gwen sentiu-se tontear.
Levantou do chão, ofegante, e cambaleou dois passos para trás. A cada pulsação notava a vista escurecer e trazer de volta aqueles mesmos olhos azuis – ora cheios de vida, ora inertes. Houve uma briga, mas não conseguia lembrar o que fora dito, apenas os gritos. Estes que a levaram às expectativas de sua punição. Alguém deve ter ouvido, alguém encontraria o corpo, alguém saberia que costumavam brigar, alguém encontraria suas digitais no colar da garota e seu DNA nos cacos de vidro. Para ela, soava como mais uma vitória de Nathaniel Strauss.
A porta então se abriu, vagarosamente. O enfermeiro Peter adentrou a sala de música em silêncio, mas atento a tudo o que indicava ser uma cena de crime.
— Gwenett, Gwenett... — Sussurrou seu nome como uma constatação.
Ela mal o havia notado ali. Assistiu-o passar por ela até a beirada da janela quebrada sem esboçar qualquer reação.
— Droga, ela morreu... — Ele a encarou de volta. — Não temos muito tempo agora.
— O que?
Ele caminhou até ela e colocou uma mão sobre seu ombro esquerdo.
— Preciso que vá ao seu quarto e me espere voltar. Eu sei o que fazer.
— O que...? Você vai...?
— Confie em mim. Vá para o quarto e me espere voltar. Farei tudo isso desaparecer.
Ela deu um passo para trás, atenta a janela quebrada. Algo lhe dizia que não seria assim tão fácil.
— Vá, agora — Peter pediu novamente.
Gwen confiava nele, por assim dizer. Fora Peter o responsável por sua estadia na St. Jude ir de um pesadelo a um sono tranquilo. Por sua causa tivera forças para suportar os pós-operatórios e confiar em sua melhora progressiva. Fazer Nate acreditar em seu estado vegetativo durante as visitas também fora ideia dele, para que ninguém contasse com um retorno triunfal. Apenas o dinheiro era capaz de comprar este tipo de lealdade; sendo assim, Peter o amigo mais leal com quem poderia contar.
O quarto particular de Gwen já não era mais próximo às instalações do salão de música. Independente disso, fez seu trajeto até o final sem ser surpreendida por algum enfermeiro ou levantar a suspeita dos médicos de plantão. Já do lado de dentro, pôs-se a chorar inconsolavelmente. Colocou as mãos sobre a boca, escorou-se na porta e deslizou até o chão.
A expressão de Taylor no momento da queda assombrava seus pensamentos. Ela não merecia morrer, mas não poderia ser presa por este crime. Aceitaria qualquer castigo, exceto que lhe tirassem a liberdade outra vez.
Abruptamente levantou do chão e tirou a mochila de baixo da cama. Um a um de seus pertences foram sendo dispostos de forma desmazelada. Haviam aqueles que ela fazia questão, como a foto em família na patinação no gelo em Wollman Rink; e haviam os que ficariam ali sem que desse por falta. Quando olhou para a foto, sentiu que todos eles estavam longe demais para que pudesse alcançar. Era melhor não olhar por muito tempo.
Pegou roupas, livros, canetas, lápis de cor, desenhos inacabados, prendedores de cabelo, e no banheiro shampoo e as loções cicatrizantes.
— Gwen, sou eu — Ouviu Peter chamar do outro lado da porta.
Ele adentrou assim que ela abriu.
— O que está fazendo?
— Pegando o que posso — Colocou o caderno de desenhos dentro da mochila, depois seguiu em direção a última pilha de roupas.
— Não, você precisa deixar tudo onde está. Eu tenho um plano.
— Eu só preciso sair daqui sem ser vista, depois pensamos no que fazer — Disse enquanto terminava de agasalhar.
— Você não pode fugir sem estragar seu plano de voltar à Manhattan.
— O que eu deveria fazer, Peter?
— Me dê sua pulseira de identificação.
— Para que?
— Me dê — Ele puxou, entregando-a outra logo em seguida. — Coloque esta.
Gwen encarava os números sem entender.
— O que está acontecendo?
— Você está morta, Gwen. É o que Theon quer.
— Taylor...
— Tem as mesmas características que você — Ele checava o aplicativo de validação em seu celular. Bastou aproximar a pulseira de Gwen do leitor. — E o que restou dela está irreconhecível. Quando eu trocar estas pulseiras, vão pensar que é você.
Não pode ser a única maneira, ela pensava. A expressão de Peter dizia o contrário.
— Para onde eu vou? — Gwen quis ter certeza de que ele estava falando sério.
— O motorista de Theon a estará esperando na rodoviária. Aqui — Entregou-lhe um maço de dinheiro que tirara do bolso. — Você só precisa chegar lá inteira. Não fale com ninguém, faça de tudo para evitar câmeras de vigilância. Você não pode levar isso — Tomou a mochila das mãos dela. — Venha comigo.
Juntos eles entraram no quarto de Taylor, duas portas depois. Peter tirou a mochila azul do armário como se já soubesse onde encontra-la.
— Coloque o que puder aqui dentro — Jogou-a na cama, de zíper aberto.
Gwen fez o que lhe foi dito sem questionar. Não precisava ir muito longe para saber o que Taylor levaria consigo caso investisse em uma fuga de emergência. Focou nas roupas de marca, quites de maquiagem, revistas de fofoca, cartas de fãs e fotos autografadas; tudo o que lembrava sua vida de socialite antes da reabilitação. Era algo que Gwen entendia.
— Estou pronta — Avisou a Peter.
— Vamos lá.
Antes de descer, Peter se certificou de que todo o sistema de vigilância estivesse offline e nenhum enfermeiro fora de suas salas. Tiveram sorte por ninguém ter ouvido; não teriam tanta sorte assim se fossem flagrados.
Já na saída dos fundos, ouviram o alarme soar.
— Eles a encontraram — Peter imaginou. — Vá agora! — E entregou-lhe um revólver.
Gwen só fez toma-lo em mãos, não havia tempo. Correu o mais rápido que pôde pelo campo aberto até alcançar os pinheiros no limite da clareira. Quando se sentiu segura o bastante, permitiu-se olhar para trás. Viu, através das janelas, os pacientes gritando por ajuda, e os enfermeiros correndo de um lado a outro. No céu, viu nuvens carregadas de chuva cintilando ao som de trovões – quase tão altos quanto o alarme que anunciava sua fuga. E lá estavam as primeiras sirenes policiais que subiam a colina, as luzes azuis e vermelhas.
Gwen respirou fundo, segurando a alça da mochila de Taylor. Caíram as primeiras gotas de chuva assim que ela correu.

O tempo não estava diferente naquela noite. Gwen levou uma hora cavando o túmulo debaixo de nuvens carregadas de chuva, com apenas uma lanterna auxiliar. Custou-lhe as unhas, as roupas novas e a pele que irritou com a areia, mas já podia enxergar a tampa do caixão.
Jogou a pá por cima do buraco, tomou um gole de água e livrou-se da jaqueta. Puxando a tampa com as duas mãos, foi capaz de virá-la para o outro lado. Taylor estava lá, ainda esbelta e elegante. Poderia inveja-la se não fosse a certeza de que nenhuma delas terminaria de outro jeito. E só fazia alguns dias desde que ela havia tentado lhe tirar tudo.
Quando as primeiras gotas de chuva começaram a cair, Gwen ouviu o celular tocar ao lado do túmulo. Ficou na ponta dos pés para ler o visor; eles tinham notícias. Pulou para o lado de fora e atendeu a ligação.
Muito lhe foi dito de uma só vez para que pudesse processar. E em duras palavras, a prova inquestionável da primeira derrota.
— Theon está morto — Ouviu o homem dizer.
Então eram apenas eles três agora.
  
5x01: Hell Is a Teenage Girl
“Não apenas a malvada do colégio”.

Jensen estava tentando lembrar a última vez em que ele e a mãe estiveram no mesmo cômodo e ao mesmo tempo. Tinha dez ou onze anos, recém-admitido no clube infantil de tênis. Num fim de tarde pós treino, encontrou o pai na sala de estar da mansão, gritando todas as verdades que feriam seu ego. “Ela fodeu o maldito dentista e agora está atrás meu dinheiro”. Ela, sua mãe, que chorava desesperadamente no sofá.
Naquela época era difícil determinar o que levou seu pai a sentir tanto ódio. Então seu aniversário passou, depois o de Jake, depois o dia de ação de graças, e logo três natais seguidos, sem ela. Foi quando descobriu sobre as ligações misteriosas que Laurel fazia a seu pai, exigindo grandes quantias em dinheiro para não levar seu caso a público. Patrick estava certo, outro feito imperdoável de sua mãe.
— Olá — Ela ficou de pé. O sorriso era o mesmo, embora tempo houvesse passado. — Não tinha certeza se viria.
— Eu moro aqui — Jensen foi curto e grosso.
— Eu só queria vê-lo. Está tão bonito...
— É, esse é o meu carma. O que está fazendo aqui?
Jay... — Seu irmão repreendeu.
Laurel lhe fez sinal com os olhos para não intervir. Jensen poderia falar o que quisesse, era seu direito.
— Tudo bem. Não nos vemos há tanto tempo, eu deveria ter ligado antes.
Sim, nove anos atrás. Foram nove aniversários perdidos, nove natais, nove dias de ação de graça, nove dias da independência, e uma infinidade de apresentações escolares e campeonatos de tênis. Para ser justo, Jensen teria que pensar em nove madeiras de manda-la embora.
— Foi por isso que você me ligou tantas vezes? — Jensen perguntou ao irmão.
— Você não ouviu meus recados?
— Deveria ter ouvido — Voltou à mãe seu olhar rígido, então a convidada especial na poltrona.
— Esta é Aria, minha enteada — Laurel disse. — Ela está comigo.
— E seu marido?
Sua expressão mudou em um instante.
— Ele faleceu há alguns dias. Ataque cardíaco.
— E você precisa de dinheiro para enterra-lo?
Jake pôs-se em pé.
— Você ta pegando pesado.
— Você está certo — Jensen cruzou os braços. — Fazer o papel do filho revoltado não combina comigo. Deveríamos chamar os seguranças.
— Quer que eu vá? Eu vou — Laurel tomou a bolsa em mãos. — Talvez não seja o momento certo.
Após o corrido, Jensen se surpreenderia se houvesse um momento certo. Esta era batalha que iria perder, infelizmente.
— Quer saber? Fique — Disse a ela. — Você já convenceu Jake que tem boas intenções, e não tenho dúvidas de que vai convencer meu pai também. Não há nada que eu possa fazer, então eu mesmo saio.
Jay, por favor... — Seu irmão pediu.
— Preciso de uma bebida, de qualquer forma — Tomou o casaco das mãos da empregada e vestiu. — Sinta-se em casa, Laurel. Você também, Aria. Estamos muito felizes por termos a família reunida — Mostrou um sorriso falso antes de bater à porta.
Descendo às escadas da varanda, toda sua energia sarcástica fluiu para longe. Estava exausto; mais que isso, furioso. A bebida não lhe era uma má ideia agora que só ela restava.
O único ensinamento valioso de sua mãe.


Alex parou numa loja de conveniência a caminho da cidade. Pegou salgadinhos, biscoitos recheados, chantilly, uma bandeja de morangos e uma revista de fofocas. Deixando tudo em cima do balcão, pegou uma garrafa de whisky, um carregador portátil e três barras de chocolate branco. O homem no caixa olhava para ele e os produtos sem entender a relação.
Alex fez puxar uma tira de camisinhas e jogar na pilha.
— Vocês têm escova de dentes elétrica?
O homem fez sinal com a cabeça. Alex notou, de imediato, a estante de produtos higiênicos ao lado do caixa.
— Talvez eu precise de algumas pilhas.
O homem jogou um par sobre o balcão, seguido por Alex a jogar mais sete.
— Obrigado — De tão constrangido, virou o olhar.
Quem dera estivesse se preparando para uma perversão sexual como julgava o outro homem. Vivia, na verdade, sob uma perspectiva unilateral. Não tinha mais namorado, amante, fãs e propostas de trabalho, mas ainda podia comprar o que quisesse para fazer o que quisesse. Uma escova de dentes elétrica para ver chacoalhar e contar quanto tempo levaria para desligar sozinha. Três barras de chocolate para derreter e tentar consumir líquidas pela primeira vez. Estava pensando em fazer balões de camisinha e jogar da cobertura para assustar as pessoas na rua. As que não usaria para experiências científicas, é claro.
— Volte sempre — Lhe disse o homem do caixa ao entregar as sacolas.
Ale voltou ao carro, jogou as sacolas no banco de trás e pisou no acelerador. Ignorara a maioria da sinalização desde Hampton Bays, o que incluía exceder o limite de velocidade para filmar a reação das bochechas ao vento. Estava tudo no story de seu Instagram, se alguém pedisse por provas de condenação.
A oito quilômetros do posto de gasolina, sua última parada, avistou uma picape azul no acostamento. Uma jovem de cabelos loiros e camiseta xadrez esperava à beira da estrada, sentada em uma mala retangular. Alex desacelerou aos poucos e ela levantou de súbito.
— Algum problema? — Alex perguntou.
A garota encantou-se à primeira vista. Não como se estivesse interessada, era mais uma surpresa incapaz de disfarçar. A Alex nunca faria sentido. Não sabia tratar-se de Lexi Palmer, a ex melhor amiga que Nate abandonou em Paris.
— Pneu furado — Ela finalmente respondeu. Teve certeza de estar falando com Alex Strauss, o gêmeo bom, pelos encantadores olhos azuis. — Esperei ser atacada por canibais deformados no meio da estrada, mas você apareceu primeiro.
— Seria interessante — De acordo a todos os seus filmes de terror favoritos. — Tem um pneu adicional? Eu poderia trocar.
— Se eu tivesse um, trocaria eu mesma, mas a picape é alugada. Estava pensando em uma carona, se estiver indo à cidade.
Alex considerou a ideia por um instante, o olhar na estrada. Teria que se comportar no volante se tivesse companhia.
— Preciso de uma resposta — Ela brincou. — Canibais, lembra?
— Tudo bem, pode entrar — Abriu-lhe a porta do passageiro.
Ela pediu, já acomodada, o celular emprestado. Alguns honorários estariam em conta com seus dois parceiros assim que a empresa buscasse a picape.
— Me chamo Lexi, a propósito. Vai me dizer seu nome? — Ela decidiu quebrar o gelo.
— Alex — Ele disse, sem tirar os olhos da estrada.
— Alex Alex, nome e sobrenome? Ou apenas Alex, não posso dar muita informação?
— De onde você é?
— Nasci em Amsterdã, mas vivi em Paris nos últimos sete anos.
Por isso não o reconheceu, era sua primeira vez em Nova York.
— Precisa de ajuda para chegar a algum lugar? — Ele perguntou.
— Na verdade, sim — Ela tirou um mapa do bolso frontal. — Tenho um amigo vivendo no Upper East Side. Ele disse que poderia me hospedar com quando eu viesse à cidade. Espero que a oferta ainda esteja de pé — Virou o outro lado da folha.
Enquanto ela traçava uma rota alternativa, Alex notou a tatuagem estrelada em seu pulso direito, que fora antes coberta por um montante de pulseiras ornamentais. Isso o fez pensar. Seu nome era Lexi Palmer, como a ex melhor amiga de Nate. Cabelos loiros cacheados, como o irmão descrevera. Vindo de Paris, onde Nate passara três anos. Amigo que vive no Upper East Side – onde Nate e o restante da família passaram a viver após o incêndio na mansão Strauss. E agora a tatuagem estrelada nos pulsos. Nate dedicara uma passagem a ela em seu diário, durante os eventos da noite em que conheceu Thayer em Paris.
— Há quanto tempo não vê seu amigo? — Alex jogava verde.
— Alguns anos. Disseram que ele está muito diferente, algo próximo às mudanças de filmes de superação, se é que podemos colocar dessa forma.
Mas a última vez em que Lexi e Nate se viram foi na noite em que Theon perdeu um olho – e consequentemente, a noite em que Nate voltou à Nova York. Três anos já haviam se passado, e Nate estava pronto para executar seu plano de vingança. Era impossível não reconhecer seu irmão gêmeo.
Mentirosa, pensou. E a pior delas, do tipo que é pega.
 — Você tem certeza? — Alex insistiu.
Lexi olhou para ele como se estivesse confessando seu crime. É claro, Nate, Alex e Mia não esconderiam nada um do outro, embora Gwen tenha afirmado que os trigêmeos nunca estiveram tão distantes. Sentia-se agora extremamente azarada.
Alex bateu na traseira de um Porsche estacionado, propositalmente. Os airbags inflaram em ambos os assentos. Ele rapidamente tirou os cintos da passageira, abriu a porta e jogou-a para fora. Lexi, de tão atordoada, fora incapaz de entender o que aconteceu entre o impacto e sua queda no asfalto.
— Não sei porque está aqui, ou o que quer com meu irmão... — Alex parou em pé em frente a ela. — Mas se a virmos novamente, vamos deporta-la. Encontre outro lugar para dormir — Jogou a mala aos pés dela e voltou ao veículo.
Outra suposição incorreta; Alex não era o gêmeo bom – estava bem longe disso. Lexi o observou partir no chão, apoiada com os cotovelos no asfalto. Limpou a marca de sangue nos lábios enquanto era deixada para trás sobre um manto de poeira.
— Filho da puta... — Agora lhe tinha tanto rancor quanto guardara por seu irmão gêmeo.
Alex, por ter sido tão claro, não esperava que fosse vê-la outra vez. Tampouco era preciso falar sobre ela para o irmão. Talvez ele nem quisesse ouvir.
Estava cansado, acima de qualquer outra coisa. Por dirigir o dia inteiro, por lidar com as novas ameaças, por não ter tido tempo para um banho quente. Chegou em casa e foi deixando as roupas do corpo por onde passava, a caminho do quarto. Sobre a cama havia um envelope branco etiquetado sofisticadamente. Estava certo ao pensar que se tratava de um convite.
“The Capitale Finnest Event – A Night at the Masked Ball”.
Ele virou para ler o verso.
Alexander Bennett”
Não Strauss; Bennett.
Fazia algum tempo desde que fora reconhecido por este nome. E o último que lhe havia dito fora Thayer.
— Vó? — Ele chamou. Lydia apareceu na porta do quarto em um instante. — O que é isso? — Ergueu o envelope.
— Recebemos hoje de manhã, tomei a liberdade de deixar em sua cama.
— Quem enviou?
— Não faço ideia. Há um convite para os três.
Alex apenas assentiu.
— Obrigado.
— O jantar está quase pronto, reservarei um assento — Ela sorriu uma última vez.
Alex jogou o envelope de volta na cama. Decidiria mais tarde se estava ou não interessado, de acordo com a resposta dos irmãos. Pensou por um instante se Thayer também recebera o convite, ou se gostaria de acompanha-lo.
Thayer estava ainda no Liberty County Hospital, repetindo a mesma rotina de exames e medicamentos diariamente. Naquele dia em particular, passara a maior parte do tempo dentro do quarto. Algo sobre Travis odiar a ideia de ter o irmão perambulando sozinho pelos corredores do hospital, como se Thayer Van Der Wall nunca tivesse improvisado uma companhia antes. Fora obrigado, em função disto, a fazer todas as refeições na cama – e os exames de rotina também. Estava mortalmente entediado e com sede de cafeína. Também se sentia mal-humorado e excitado, não necessariamente nessa ordem.
— Xeque-Mate — Ele anunciou, derrubando a peça do rei branco.
Travis encarava o tabuleiro sem entender.
— Como você faz isso?
— Os anos de prática que você não tem — Seu pescoço estalou num torcer.
— Está sentindo alguma coisa?
— Estou aqui há tempo demais.
— Recomendações médicas.
Thayer temia que não dissesse isso. Pois se não, nunca haveria uma oportunidade para fugir.
— Já que estou tetraplégico, se importa em me trazer algo para beber?
Travis já havia desistido de reorganizar o tabuleiro.
— Volto logo — Assim deixou-o.
Thayer só esperou que dobrasse no primeiro corredor para sair da cama. De trás do travesseiro tirou algumas notas de dólar, e logo estava calçando os sapatos hospitalares. Saiu do quarto discretamente e caminhou até as máquinas de venda expressa. Cafeína, finalmente.
Esperou que alguns médicos passassem, colocou uma nota e pressionou os botões de escolha. Nada aconteceu e nada aconteceria, sem importar que batesse na vidraça ou rogasse pragas iconoclastas.
— Ela é um pouco tímida — Ouviu alguém dizer.
Só então notou o jovem de roupão listrado parado em frente a máquina ao lado. Era loiro, usava óculos de grau e tinha uma trilha de sardas que percorriam o nariz até a testa. Havia um charme desengonçado na maneira que ele sorria.
— Como é? — Thayer indagou.
— Não vai funcionar se você for tão agressivo.
Thayer voltou o olhar a máquina. Sentia-se estranhamente arrependido agora.
— Desculpe, Dona Cappuccino.
— Queria poder pagar o seu, mas meus pais deixaram pouco dinheiro.
— Tudo bem — Thayer deu de ombros. — É o universo me dizendo que eu deveria me divertir sem cafeína.
— Não há muito o que fazer por aqui — O jovem colocou outra moeda na máquina à frente. — Às vezes eu só queria colocar umas roupas, roubar um carro e dar o fora.


    Thayer estava com aquele olhar de novo, de quem não consegue se afastar dos problemas. Minutos depois, e sem que o jovem tivesse escolha, estavam os dois num carro roubado em alta velocidade, com as roupas que encontraram no armário dos residentes.
O garoto parecia estar prestes a vomitar.
— Desculpa, cara — Thayer lhe disse. — Meu namorado era um kamikaze no volante.
— Isso não está ajudando... — Ele gaguejava.
— Qual seu nome?
— Ni...Ni...Nick.
— Hetero ou gay?
— He...Hetero.
— Eu sabia. Apenas a sua espécie usaria aquele roupão.
Eles pararam na lanchonete mais próxima após a saída na rodovia. Foram notados por todos os presentes – e como não seriam? Um jovem careca usando um boné cor de rosa da moranguinho e o outro com uma marca de xixi nas calças.
— Café? — Thayer sugeriu.
— Qualquer coisa — O garoto pediu.
Juntos eles sentaram à única mesa disponível na fileira das janelas. A garçonete anotou seus pedidos, o olhar desconfiado.
Thayer não soube se estava vendo coisas, naquele momento, ou se podia confiar nos sinais. Pensou ter visto Gwen deixando um prédio do outro lado da rua e entrando numa limusine preta. Tinha os mesmos cabelos loiros, usava as mesmas roupas de tom claro em combinação e ostentava uma cicatriz no rosto, que corria verticalmente em tom rubro sobre o olho esquerdo.
— Mas o que...? — Thayer levantou de maneira brusca, derrubando sobre a própria jaqueta uma xícara de café quente que uma garçonete levava a mesa ao lado.
— Ai meu Deus, eu sinto muito! — A moça tentou ajuda-lo com o guardanapo que carregava.
— Não, é culpa minha. Tudo bem.
— Você levantou tão de repente...
— Eu sei, pode deixar — Voltou a olhar pela janela. A limusine já havia partido. — Onde fica o banheiro?
— É só seguir a luz vermelha — Ela apontou para a extremidade direita do balcão.
Antes de seguir o trajeto, Thayer pediu para que Nick o esperasse onde estava.
O banheiro havia acabado de ser desocupado por um pai e seu filho pequeno quando ele chegou. Pôs a jaqueta sobre a pia, ligou a torneira e deslizou a mão sobre a camiseta. Algum residente azarado do Liberty County Hospital teria sérios problemas na lavanderia para torna-la utilizável outra vez. Não importava, Thayer o recompensaria com um closet totalmente novo para pagar pelo furto.
— Droga... — Sentiu arder o local afetado com um simples toque.
Feito a limpeza, juntou as mãos embaixo da torneira e levou ao rosto uma porção de água. Olhou-se brevemente no espelho; era a primeira vez desde que cortara os cabelos. Algo lhe dizia que os remédios pouco tinham a ver com o que acabara de presenciar. Ou simplesmente nada.


Estavam sob o toldo carmesim do Strauss Empire Hotel. Ele olhava para ela com os olhos cheios de ganância, e eram indiscutivelmente os mais horrendos que Mia já viu.
— Dorian, há pessoas por perto — Ela sorriu envergonhada. Em breve ganharia um prêmio por esta mesma atuação.
— Ninguém sabe que estamos aqui... — Ele a beijou. — Suba comigo.
— Você é inacreditável.
— Isso é um sim?
Ela o beijou de volta.
— Isso é um sim.
Logo ele tomou a frente, e ela ficou alguns passos atrás para trabalhar sua estratégia.
— Estamos subindo agora — Sussurrou para o ponto de comunicação no ouvido.
Do outro lado, Kerr passava todas as instruções. Quem abrisse a porta do quarto o encontraria só de cuecas e camiseta em frente ao notebook, com um pacote de salgadinhos nas mãos e um fone headset envolto aos cabelos negros.
— Estou vendo vocês — Ele confirmou, no momento exato em que Mia lançava um olha fatal para a câmera de segurança. — Ele é incrivelmente mais feio que a foto asquerosa do Facebook.
Ela apenas riu, discretamente. Quando as portas do elevador se fecharam, ele se deixou domar. Mia o beijou por inteiro, com as pernas trançadas sobre as dele e as mãos em volta do pescoço. Kerr precisou desativar o áudio para não ouvir os gemidos.
— Você é muito comprometida com a missão, senhorita — Nunca entenderia de onde vinha tanta coragem.
De qualquer forma, o show estava prestes a terminar. As portas do elevador se abriram, e, por conseguinte, os convidados da festa surpresa de Dorian puderam testemunhar o começo do fim de seu casamento. Um deles, que segurava uma bexiga quase cheia em mãos, acabou deixando-a voar pelos aposentos. Sua mulher, a elegante Janine Sibley, tinha em mãos o bolo que ela mesma levara o dia para cozinhar.
— Oh, não... — Dorian lamentou.
Todos que conhecia estavam ali, desde os clientes que contrataram seus serviços como investigador particular às primas de segundo grau que só encontrava em datas comemorativas.
— Você é inacreditável! — Janine o acertou no rosto com o bolo.
Formou-se então o alarde. Todos gritavam em uníssimo enquanto a esposa traída acertava o marido com chutes e bofetadas. Mia teve que prender um riso.
— Você disse que viajaria com a família! — Dorian disse em certo momento.
— Eu menti para te fazer uma surpresa, seu maldito filho da puta! — Janine lardeava. E logo já não era mais sobre penalizar o marido adúltero, e sim a mulher com quem o vira chegar. — E você... — Ela arregalou os olhos. — O meu vestido? Ele te deu o meu vestido? Tire agora!
Os familiares tentaram impedi-la, mas Janine, de tão furiosa, parecia tão forte quanto uma alcateia de lobos. Mia teve alguns fios de cabelos arrancados durante o atrito, além de rasgar uma parte da alça direta do vestido. Por isso também lhe deu uma bofetada. Ninguém poderia tocar em um fio do seu cabelo, e aquele era um lindo vestido púrpura de dezesseis mil dólares.
O que não esperava era ver a mulher chorar descontroladamente como uma criança fazendo birra.
— Olha o que você fez! — Dorian aproximou-se da esposa, no chão.
Mia foi dos convidados a ele, e dele aos convidados. Só havia uma maneira de terminar o que começou.
— Tudo bem — Ela disse enquanto tirava o vestido.
Naquela noite havia decidido abrir mão das roupas de baixo – também para que suas táticas de sedução funcionassem. Devolvendo o vestido, como um ato solidário para a pobre esposa, mostrou-se completamente nua e desinibida aos presentes. Caminhou assim mesmo de volta ao elevador e fez um sinal de tchau antes das portas se fecharem.
No décimo quarto andar, as portas abertas revelaram um jovem de boné e skate a espera. Por pouco não esquecera de entrar no elevador e apertar os botões. Mia lhe havia tirado toda a perspectiva apenas em estar ali.
Alguns andares após se firmar o silêncio constrangedor, seu sorvete começou a derreter sobre os dedos. Uma gota respingou levemente nas pernas de Mia.
— É de morango? — Ela perguntou.
— S-s-sim — Ele gaguejou.
Ela então deu uma lambida erótica na casquinha, provocando-o com o olhar.
— Obrigada. Estava com tanta sede.
E em compensação, o garoto estava com água na boca.
Mia seguiu trajeto pelo lobby do hotel quando as portas se abriram. Entre o olhar curioso de um e outro, que lhe dedicavam toda a atenção, notou também o repúdio dos hóspedes mais conservadores. Uma mãe tapou os olhos do filho mais novo que tentava veemente continuar encarando, e uma senhora de idade levou o marido na direção contrária.
Mia precisou de apenas quinze segundos para roubar o casaco de uma das hóspedes no encosto do sofá de visitas e atravessar o salão até a entrada principal.
— Hey, isso é meu! — A mulher gritou.
— Vá a recepção e diga que Michaela Strauss a ofereceu uma estadia gratuita — Fez um laço em volta da cintura, de casaco fechado.
Lá fora o clima estava diferente. Chovia apenas a decoração de aniversário pela janela de Dorian, não das nuvens carregadas em alerta. Mia revirou os olhos, seguido de um leve suspiro. Tão previsível... pelo menos não foram as roupas do marido infiel, como exigia o clichê.
A primeira coisa que fez ao entrar na limusine foi ligar para Kerr.
— Dirija, por favor — Pediu ao motorista
— Isso foi tão frio da sua parte — Kerr comentou através do ponto.
— Está dizendo que não faria o mesmo?
Ele pensou por um instante.
— Dorian mentiu sobre seu pai, mas foi Lydia quem o pagou. Ainda vai precisar lidar com ela.
Este lhe seria o mais difícil. Lydia sempre esteve presente em sua vida como a amiga de longas datas que a mãe encontrava uma vez ao mês e dava os melhores presentes de aniversário, natal e dia das crianças. Tinha, decerto, um bom motivo para convencer o detetive particular a mentir sobre seu pai, o que estabelecia um crime tão grave quanto ao de Dorian, que aceitou o suborno em notas de cem. Por que pagaria tão caro para impedi-la de descobrir a própria história?
— Lidarei com ela amanhã. Por favor, apague todos os vídeos das câmeras de segurança. Não quero ser conhecida como a tarada do elevador.
— Como quiser — Um clique depois e estava tudo certo.
Mia agradeceu uma última vez e livrou-se do ponto pela janela.
— Para onde, senhorita? — O motorista enfim perguntou.
— A sorveteria mais próxima, por favor.
Coincidentemente, morango era seu sabor preferido.


Jensen estava em sua terceira dose de vodka pura. Atrás do balcão, a atendente do turno começava a se preocupar.
— Noite ruim? — Arriscou uma pergunta.
— Eu odeio minha família.
— É um bom motivo para beber — Ela encheu novamente seu copo.
Jensen deu um ar de risos. Confiaria na opinião de qualquer garota de undercut colorido e tatuagens que afirmasse entender de problemas familiares. Se havia quem abandonasse os filhos e os rejeitasse à custa de sua orientação sexual, haveria alguém também para problematizar o estilo não convencional de ser rebelde. Pensar nisso fazia-o lembrar de Jake e todas as vezes em que desafiou o pai para defende-lo.
— Outra, por favor — Jensen pediu.
Atrás dele o ruído da porta anunciou a entrada de Gwen. Ela olhou ao redor, atenta a cada rosto. O lugar a esquerda, no bar, não havia sido ocupado.
Jensen sentiu primeiro a fragrância de um perfume conhecido. Remitia a sua adolescência, que remetia aos seus amigos, e que, enfim, levou-o a lembrança vívida que estava procurando. O nome dela lhe veio à mente, mas precisou olha-la nos olhos para ter certeza.
— Gwenett — Sussurrou seu nome como uma maldição.
— Sem recepção de boas-vindas? Tudo bem por mim — Olhou para a garçonete. — Uma dose de vodka, por favor. Este era o último lugar onde esperava encontra-lo, Jensen — Agradeceu após servida. — Achei que afogava as mágoas se divertindo com garotos de aplicativos.
— Eu não sei se quero saber como isso é possível.
— Eu estar aqui? Acredite, não foi ideia minha dar uma de morta. Como Nate diz? “Temos assuntos inacabados?”. — Sorriu mordaz. — Aquela vagabunda é cheia de história — E enfim tomou a dose.
Jensen não lembrava de alguma outra noite pior que aquela.
— O que você quer?
— Minha vida de volta, é claro. Pretendo começar pela minha família.
— Depois de obriga-los a enterrar um caixão vazio?
— Eu não diria vazio — ela confessou. — Mas se eu não estou enterrada naquele túmulo, então quem está?
Jensen pensou rápido. Tentou ligar à noite inteira para Nate e sempre caia na caixa postal. Nate, o responsável pela horrível cicatriz que corria o olho esquerdo de Gwen.
— Ai meu Deus... — Ele finalmente entendeu.
Ela apenas sorriu, vitoriosa. E ele correu pelas portas o mais rápido que podia. Entrou no carro, colocou o cinto e arrancou em direção ao cemitério. Chegando lá, atravessou os portões de ferro em busca do túmulo de Gwenett Strauss. Uma pá fora escorada à lápide como se o estivesse esperando.
Ele cavou, cavou e cavou. Era capaz de ouvir seus gritos após o primeiro metro.
— Estou aqui! — Queria que ele soubesse. — Nate, estou aqui!
Logo sentiu a pá tocar a porta do caixão. Ao mover sobre a terra, Nate pulou em seus braços, chorando, sufocado.
— Está tudo bem — Jensen o acariciou. — O encontrei a tempo, nada vai acontecer.
— Gwen está viva! — Nate gritava.
— Eu sei. Eu sei...
— Não conseguia respirar...
— Estou aqui, estou com você.
Por cima dos ombros de Nate, Jensen notou algo estranho dentro do caixão aberto.
— Tem alguma coisa...                     
Nate também olhou. As palavras “Hell is Me” foram escritas com batom vermelho e em letras de forma.
Para começar uma guerra, Gwen só precisava pedir.

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      5x02: For a Minute, Maybe Two, But Not in Public (18 de Agosto)
      Então pessoal, essa foi a nossa estreia. Se gostaram, não gostaram, queriam mais, têm alguma dúvida, é só utilizar dos comentários abaixo.
    Agora gostaria de usar este espaço para um pequeno aviso. Na quinta-feira dessa semana estarei realizando um procedimento de retirada da vesícula. Nada grave, é claro, mas não é bem isso que minha ansiedade anda dizendo. Qualquer coisa que aconteça, como por exemplo, eu precisar ficar mais tempo internado, não teremos capítulo semana que vem. Darei meu melhor pra me recuperar e voltar pra casa já na sexta-feira. Beijão, até a próxima <3
Comentário(s)
4 Comentário(s)

4 comentários:

  1. AAAAAAAAAAAAAAAAAAAA GWEN NÃO VALE NADA HAHAHAH. E o Alex expulsando a Lexi, socorro ksksjks. Não vejo a hora do próximo. E boa sorte na cirurgia, João. Vai dar tudo certo ��

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    1. Que bom que gostou, Rafa. O movimento tava bem fraco aqui, eu fiquei um pouco preocupado KKKKKKK
      O próximo sai nesse domingo, decidimos trocar os dias de publicação. Se não der certo voltamos com os sábados.

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  2. Cadê os outros caoítulos? Estou surtando, preciso deles!

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