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[Livro] A Punhalada 3 - Capítulo 11: Meu Inimigo


Chloe não sabia há quanto tempo observava todos os movimentos dentro da casa dos Channing. Havia estacionado seu carro alugado a doze metros do local só para conseguir espionar Isaac e Nora levando uma vida cotidiana. Fazer comida, almoçar, levar o lixo pra fora, lavar o carro... Nada de tão interessante para sustentar sua ultima teoria: Isaac poderia mesmo ser um dos novos assassinos.

De acordo com Aaron, Amanda conhecera um jovem rapaz se passando por um universitário em um bar. Este mesmo rapaz foi inteligente o suficiente para acionar o GPS do seu carro sem que ela percebesse e encontrar sua residência, além de insistir para manter aquela desconhecida em sua vida. Não era o tipo de coisa que Chloe Field deixaria passar, mesmo que a polícia não pudesse compartilhar da mesma suspeita.

Os vinte segundos dedicados para fazer algumas anotações relativas deram a Megan uma chance de aparecer de surpresa para se infiltrar em mais uma missão.

— Esse sol está me matando! — Megan sentou no banco do passageiro e tirou os óculos escuros.

— Megan? — Chloe não sabia se estava surpresa, assustada, ou apenas sonhando.

— Olá. Você trouxe protetor solar?

— O que você está fazendo aqui?

— Eu segui você quando saiu do hotel. Estou ficando boa nisso. — Olhando para o espelho do retrovisor interno, Megan passou o indicador nos dentes da frente.

— Não significa que estou a procura de companhia.

— Você quer morrer sozinha?

— Não. — Chloe fez uma careta.

— Você quer ser perseguida por um assassino mascarado e não ter ninguém para acertar um vaso na cabeça dele?

— Eu acho que não.

— Você quer se esconder dentro de uma sala e não ter ninguém que carregue três celulares ao seu lado?

— Megan...

— Olha! — Megan tirou um dos celulares de seu sutiã. — É descartável. Podemos ligar pra 911 e jogar pacman versão heavy metal!

— Ok, se acalme. Não podemos chamar atenção, estou tentando...

— Espionar Isaac Channing. Dezessete anos, estudante do ensino médio, namorado de Lexi Hardy e filho de Nora Channing, uma das líderes religiosas mais influentes do bairro. Se ele é o assassino, deve ter encontrado uma maneira de burlar os sintomas da asma diagnosticada quando tinha sete anos para conseguir matar pessoas.

Chloe não respondeu, apenas lançou um olhar curioso e espantado na direção de Megan. Como ela podia saber tanto?

— O que foi? Eu sempre faço meu dever de casa. — Megan informou.

— Então acho que você é a minha nova parceira. — Chloe sorriu.

No momento em que voltara o olhar novamente para a residência dos Channing, viu Isaac e Nora brigando através da janela. A distância lhe impedia de ouvir com clareza o que ambos estavam dizendo, mas tinha certeza que a relação dos dois estava abalada o suficiente para transformar qualquer coisa em uma briga de verdade.

No final de tudo, Isaac saiu furioso pela porta e entrou no carro estacionado em frente a casa. Todas as tentativas de Nora para fazê-lo ficar foram em vão. Ele partiu com o carro em alta velocidade enquanto a mãe gritava seu nome.

— Ele está indo embora! — Chloe preparou a marcha de seu carro para segui-lo.

— Aonde acha que ele vai?

— Vamos descobrir.

Chloe e Megan passaram mais de vinte minutos seguindo Isaac para todos os lados, sempre mantando uma distância considerável para que ele não percebesse que tinha companhia. Em todo o seu trajeto, nenhuma infração foi cometida. Nenhum sinal foi ignorado. Nenhuma faixa de pedestres foi desrespeitada. Eram informações aparentemente irrelevantes que Chloe precisava observar com um pouco mais de atenção. Principalmente depois de ler em vários livros todas as características que poderiam identificar um serial killer.

Isaac só parou de dirigir quando se afastaram da cidade e não havia nada além de árvores em volta de um enorme galpão abandonado. Ele saiu do carro e caminhou para dentro das instalações sem olhar para trás.

— Nosso suspeito acabou mesmo de entrar em um galpão abandonado ou eu exagerei na Marijuana? — Megan sussurrou de maneira sutil.

— Gostaria de saber o que tem lá dentro... — Chloe lançou um olhar cheio de segundas intenções para sua nova parceira.

— Não, nem pensar! Eu não vou lá dentro! Ele pode estar construindo sua própria centopeia humana e eu definitivamente não quero ver isso.

— Não precisa ser tão dramática, já viemos até aqui... — Chloe olhou mais uma vez para o galpão ao longe. Parecia tão interessante que só precisava de mais alguns segundos para criar coragem e investigar por conta própria.

— Então por que não vai você? Você é a Nikita, eu sou apenas a recruta bonita que perdeu os pais em um incêndio, ok?

— Vamos nós duas, não podemos nos separar. — Chloe saiu do carro.

— Chloe, não... Merda! — Megan também saiu para acompanha-la. — Essa é uma péssima ideia. Deveríamos chamar a SWAT e pedir café no Starbucks!

— Megan, cala a boca!

— Por que vocês duas estão me seguindo? — Isaac de repente apareceu por trás do carro, a apenas três metros das garotas.

Megan e Chloe olharam para trás vagarosamente enquanto sentiam a espinha gelar. Isaac não havia apenas descoberto que estava sendo seguido. Ele estava ali, parado feito uma estátua, com uma expressão maldosa que poderia indicar qualquer coisa exceto a sua inocência. Ou esta era exatamente a verdade?

— Seguindo? — Chloe engoliu em seco. — Nós estamos... Perdidas. Precisamos de uma informação.

— Eu vi vocês duas vigiando minha casa. Poderiam apenas dizer a verdade?

— Ok, eu sinto muito, eu sinto muito mesmo. Só queríamos conhecer o namorado da Natalie, ela não queria nos contar.

— Natalie? — Isaac não estava comprando nenhuma palavra que saia da boca de Chloe. — Ok. Eu sou o Isaac. E dentro daquele galpão tem cinco criminosos apostando dinheiro alto em um jogo de poker. Eles matariam qualquer pessoa que se aproximasse de descobrir o que este lugar realmente significa.

Megan e Chloe estavam sem palavras. Aquela era a explicação perfeita para que ele tivesse deixado a cidade. E para que elas fossem embora o mais rápido possível também.

— Já estamos de saída. — Megan correu para o carro. Logo depois foi a vez de Chloe.

Elas levaram menos de dez segundos para colocar o cinto de segurança e partir com o veículo em alta velocidade. Quanto mais observavam o olhar misterioso de Isaac, mais desejavam distância daquele local. Chloe só não sabia a que conclusões deveria chegar após sua pequena missão. Era óbvio demais para ser verdade, ou era óbvio demais porque era verdade? Nenhum filme de terror poderia lhe ajudar naquele momento.
φ

Hatrett releu novamente todos os arquivos que tinha em mãos antes de entrar na sala de interrogação. Amanda estava sentada em uma das cadeiras de ferro atrás da mesa, brincando com os próprios dedos para matar o tempo. Estava esperando seu interrogatório desde que saíra as pressas da galeria sem saber o que acontecera a ex enteada. Talvez tivesse conseguido escapar antes de se tornar mais uma vítima do massacre de Chicago. Ou talvez... Amanda preferia guardar a própria culpa para quando estivesse sozinha com seus próprios demônios.

O segundo detetive – acompanhado de dois policiais fardados – entrou na sala logo após Hatrett manter-se confortável na cadeira em frente a Amanda. Seu sorriso sarcástico, apesar do propósito, parecia conveniente apenas para ele.

— Amanda Rush... — Ele fez questão de colocar ênfase em suas palavras. — A principal vítima dos massacres de New Britain que conseguiu voltar dos mortos. Seria um bom título para uma matéria de jornal.

— O prazer é meu. — Amanda respondeu, apenas para igualar o nível de cinismo entre os dois. — Posso ir agora?

— Você tem algum compromisso marcado? Você sabe, além de depor para o FBI sobre seu envolvimento com os assassinatos recentes? Ou talvez possa estar interessada em responder sobre os três crimes federais que está sendo acusada.

— Perdoe-me pela inconveniência, mas não preciso me preocupar com acusações questionáveis quando Natalie Strauss possui milhões de dólares em sua conta bancária.

— Você não sabia? Seus bens acabaram de ser congelados.

— Apenas 30% deles. Os outros 70% estão espalhados pelo mundo em contas bancárias de pessoas que não existem para que nem mesmo as leis da América possam tomar o que é meu por direito. Ou eu posso estar mentindo apenas para provocar detetives que recusaram os benefícios da aposentadoria.

— Muito engraçado. — Hatrett sorriu, furioso. — Você fala como se não estivesse dentro de uma delegacia sob a custódia de alguém que nunca vai deixa-la desaparecer outra vez.

— Você quer dinheiro?

— Eu quero saber quem está matando as pessoas da minha cidade. E algo me diz que você sabe muito mais do que está disposta a contar.

— Eu sei o suficiente para me manter viva, não para ajuda-lo.

— É por isso que apenas você consegue sobreviver. — Hatrett tirou três fotos de dentro da pasta amarela que jogara em cima da mesa. Elas mostravam claramente o que havia acontecido com Cassidy Hewitt assim que Amanda deixou a galeria.

Saber que mais alguém havia morrido naquele jogo doentio era a única coisa capaz de tirar a superioridade dos olhos de Amanda. Aquelas fotos lhe causavam uma horrível sensação que poucas pessoas saberiam compreender. Só precisava respirar fundo e fingir serenidade para impedir o detetive de continuar a intimidação.

— Esta é Cassidy Hewitt, minutos depois da chegada da perícia. Ela levou doze facadas nas costas de alguém que estava escondido no banco de trás do carro.

— Não foi culpa minha. — Amanda afastou as fotos para perto das mãos de Hatrett.

— Eu sei que você não fez isso. Acredite, eu sei. Eu só quero saber o que aconteceu.

— Nós... — Amanda suspirou. Já estava convencida de que colaborar com a polícia era a decisão certa a ser tomada. — Nós estávamos tendo uma briga quando... O corpo dessa garota foi jogado pelo teto. Ele veio atrás de nós e eu tentei salvá-la, mas...

— Quem estava atrás de vocês?

— Eu não... — Amanda colocou uma das mãos em seu rosto. A tontura estava piorando e a vista começando a embaçar.

— Senhorita Rush, quem estava atrás de vocês?

— Amanda, responda a pergunta. — Ordenou Brandon no canto da sala. Sua imagem era apenas um borrão sem sentido, mas sua voz continuava sendo a melodia mais decifrável do mundo.

— Senhorita Rush, responda a pergunta! — Hatrett exclamou logo em seguida.

Por um segundo, Amanda sentiu que seu corpo não aguentaria permanecer consciente. A dor de cabeça e a vista embaçada só pioravam enquanto o irmão dizia coisas sem sentido que pareciam ecoar na sala inteira.

— Amanda, você está bem? — Hatrett finalmente percebeu que havia algo de errado.

Segundos depois de levantar de sua cadeira para ajudar Amanda, Aaron apareceu de surpresa passando pela porta.

— O que você está fazendo? — Ele perguntou, indignado. Amanda parecia estar sofrendo um ataque de pânico.

— Nada! Eu não sei o que aconteceu.

— Venha, Amanda! — Aaron caminhou até ela e ajuda a levantar-se. Ouvir a voz do amigo foi o que lhe deu forças para lutar contra o que estava acontecendo dentro da própria cabeça.

— Ela está no meio de um interrogatório! — Hatrett exclamou.

— Você não pode mantê-la aqui, são ordens do seu superior. — Aaron esticou uma das mãos para lhe entregar o documento de liberação de Amanda. Se não fosse uma celebridade simpática e filho de um ex delegado renomado, não saberia por quanto tempo sua amiga ficaria nas mãos de Hatrett.

Com a ajuda do amigo, Amanda conseguiu caminhar para longe da sala de interrogação. E logo depois para o lado de fora, onde havia pelo menos duzentas pessoas esperando para ver com os próprios olhos a Rainha do grito. Entre paparazzi, curiosos e pessoas assustadas, Amanda não conseguia distinguir ninguém. Sua vista embaçada a impedia de enxergar qualquer coisa que não fosse um simples borrão colorido.

— Saiam da frente! — Aaron gritava para abrir caminho.

Em poucos segundos Amanda perderia a consciência. E desejava que dessa vez, em nome de tudo o que amou, nunca mais acordasse para ver a luz do dia.
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— Sinto que estou com facilidade para fazer xixi. Isso não deve ser um bom sinal... — Megan suspirou.

Meia hora depois de terem sido flagradas por Isaac, ela e Chloe continuaram dentro do carro rodando pela cidade. O destino era o hotel de Chloe, onde Kyle provavelmente estava esperando.

— Essa perseguição definitivamente vai ficar de fora do meu novo livro.

— Você está escrevendo novamente? — Megan estranhou. — Isso também não deve ser um bom sinal.

— Ok, porque vocês não gostam do meu livro? — Chloe parecia irritada. — Ele ganhou quinze prêmios diferentes e foi bem em 87% das críticas. Por que só os meus amigos não conseguem gostar?

— Deve ser porque você descreveu todos nós como pessoas frívolas que não acrescentam nada ao mundo além de uma contribuição majoritária para o crescimento da cultura pop.

— E qual o problema? Vocês eram terríveis.

— Como é? — Megan usou sua expressão intimidadora para deixar claro sua desaprovação.

— Você, Aaron e Amanda. Eram todos adolescentes superficiais que desconheciam o significado da palavra compaixão porque só estavam interessados na popularidade. Amanda torturou os desajustados da New Britain High durante doze anos. Aaron só sabia escrever livros polêmicos e fazer academia porque seu tanquinho era a única coisa que poderia defini-lo. E você, sempre invejosa, tentando ser melhor que todos ao seu redor só porque se sentia muito solitária. Eu não escrevi nenhuma mentira no meu livro. Vocês nunca foram o tipo de pessoa que todos imaginamos quando alguém diz a palavra “sobreviventes”. Mas vocês cresceram. Tornaram-se pessoas admiráveis. Conseguiram provar que merecem a chance de uma vida inteira pela frente. É isso que o mundo inteiro vai saber quando terminar de ler meu próximo livro.

— É assim que você me vê? Como uma pessoa admirável?

— Sim. — Chloe sorriu cortês. — É assim que o mundo inteiro deveria vê-la.

— Não estou me sentindo muito admirável nos ultimos dias... — Megan olhou pela janela do carro, inevitavelmente pensativa.

— Megan...

— Você poderia me deixar no hotel onde Aaron está? Tem algo que eu preciso fazer.

— Ok. — Chloe assentiu. Precisaria dar a volta e seguir por outro caminho, mas não negaria este favor a amiga.

— Acha que Amanda está lá?

— Eu não sei, não a vejo há dias.

— Ok... — Megan suspirou. Colocou o cotovelo direito na janela e deitou a cabeça em sua própria mão.

Chloe olhou para ela por alguns segundos. Parecia mesmo que precisava conversar com alguém.

— Aaron disse que você não quis ver Amanda...

— Eu não estava preparada.

— Você está agora?

— Só preciso da minha amiga de volta. — Megan suspirou mais uma vez. — Ela deve estar sozinha assim como eu. Ela deve estar assustada...

— Ela não se assusta fácil.

— É... — Megan olhou para Chloe. — Eu entendo porque você pensa assim.

Cinco minutos depois, Chloe já estava estacionando o carro em frente ao hotel de Aaron. O relógio marcava as dezesseis horas e cinquenta e sete minutos. Amanda com certeza não tinha nenhum compromisso aquela hora.

— Obrigada. — Megan abriu a porta.

— Diga que venho visita-la assim que puder.

— Tudo bem! — Megan gritou enquanto corria para dentro do hotel.

Apesar de estar atrasada para seu compromisso, Chloe resolveu descansar por alguns minutos exatamente onde estava. Deitou a cabeça no banco do carro e ficou observando o movimento da avenida onde estava. Era a única paisagem que poderia exigir depois do fiasco de sua investigação particular.

Entre um pensamento e outro, ela lembrou que ainda estava com o celular desligado no bolso e precisava ouvir suas mensagens. Só havia uma na secretária eletrônica em nome de Kyle Fuller, que provavelmente estava ligando para saber se o compromisso de ambos ainda estava de pé.

— Chloe, Chloe! — Disse ele na gravação. — Eu preciso de ajuda! Estou vendo coisas, eu estou... Eu não sei... Tem algo de errado...

Chloe imediatamente ficou em estado de alerta para ouvir melhor o restante da gravação.

— Eu não sei o que está acontecendo, eu não sei o que posso fazer... — Ela podia ouvir o choro de Kyle do outro lado da linha. — Por favor, eu preciso de ajuda...

E então, a gravação foi encerrada. Chloe imediatamente discou o número do amigo, mas caiu na caixa postal. Só lhe restava pisar fundo no acelerar e encontrar Kyle antes que alguma coisa acontecesse.

Ainda dentro do hotel, Megan correu para pegar o elevador antes que ele fechasse. Precisou dividi-lo com sete pessoas até chegar ao andar onde ficava o quarto de Aaron. Para alguém que gostaria de passar longe da moradia de duas pessoas que costumava conhecer muito bem, Megan sabia encontra-los como ninguém.

Seu plano estava borbulhando na própria mente até seus olhos notarem um motivo para a primeira hesitação. A porta do quarto de Aaron estava entreaberta, e em frente a ela, várias pegadas de um sapato masculino cheio de lama. Seria o convite perfeito para se retirar e imediatamente chamar a polícia se aquele não fosse o quarto de seu noivo. Precisava saber se algo havia acontecido ou se aquilo era apenas uma terrível coincidência.

Ao abrir a porta, ela notou que o apartamento inteiro estava uma bagunça. Copos quebrados, gavetas reviradas, objetos jogados no chão e móveis rasgados. Uma grande luta havia acontecido ali dentro. E o rastro de sangue indicava que o resultado poderia estar dentro do quarto.

Megan caminhou com passos cautelosos até onde precisava e abriu a porta. Kyle estava abaixado no meio do quarto, com o corpo inteiro sujo de sangue e uma faca nas mãos. Ao lado dele estava o corpo de Rosalee, a amiga de Amanda que Megan não sabia reconhecer.

— Ai meu Deus... — Megan sussurrou sem querer.

Kyle imediatamente virou para encará-la. Seus olhos estavam cheios de lágrimas e espelhando um desespero que ela nunca vira igual. Ele sabia o que ela estava pensando. E sabia que aquilo poderia decidir todo o seu futuro.

— Megan, não! Eu a encontrei! Eu a encontrei aqui!

— Não... —Megan colocou as mãos na boca e começou a caminhar para trás. As lágrimas caiam de seus olhos sem que precisasse fazer força.

— Megan! — Kyle olhou para suas mãos cheias de sangue, derrubando a faca no chão logo em seguida. Nem ele mesmo parecia entender o que tinha acontecido. — Não, eu... Não...

— Kyle...

— Eu não fiz isso, eu juro...

— Não! — Megan saiu correndo.

Para que pudesse ouvi-lo, Kyle correu atrás dela, mas foi nocauteado quando ela usou o taco de baseball em cima do sofá para acertá-lo na cabeça. Enquanto ele se contorcia de dores no chão, ela teve a chance de passar pela porta para pedir socorro. Havia uma infinidade de hóspedes perambulando pelos corredores, que a ajudariam no que precisasse.

— Tem um homem naquele quarto! Ele matou alguém! Ele tentou me matar!

— Fique calma! — pediu um dos hóspedes.

— Ele quer me matar! Ele matou alguém!

— Teresa, chame a polícia. — Ordenou o hóspede a garota de cabelos pretos ao seu lado.

Logo uma dúzia de hóspedes se juntou em volta de Megan para ver o que estava acontecendo.

— Teresa, chame a polícia. — Ordenou a garota de cabelos pretos ao seu lado.

— Megan! — Gritou Kyle. O machucado em sua cabeça só permitia que se movimentasse se estivesse segurando nas paredes ao seu redor.

— É ele!

Os hóspedes imediatamente correram para prender o malfeitor de Megan. Enquanto tentavam segurá-lo para que não escapasse, Megan se encolhia na parede e enxugava todas as lágrimas.

— Megan, não! Megan, eu não fiz isso! — Kyle insistia.

Mas Megan já havia decidido que nunca iria acreditar.
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Dentro de uma das boates mais elegantes da cidade, Carter Van Der Hills poderia ser visto sentado no balcão, pedindo todas as bebidas que as pessoas solitárias tinham direito. Era uma pena que quatro doses de tequila não foram o suficiente para se transformar no bêbado alegre que estava almejando. Nem mesmo as dançarinas seminuas e as musicas eletrônicas conseguiriam melhorar o humor de quem fora humilhado e escorraçado pelos patrões.

— Dia difícil? — Perguntou o barman que havia lhe servido a quarta dose de tequila. Se a memória não lhe falhava, seu nome era Max.

— Podemos colocar dessa maneira... — Carter quase sorriu de deboche.

— Talvez não esteja tão ruim. A maioria das pessoas não teria dinheiro para beber aqui nos momentos difíceis.

— Não é tarde demais para dar o calote. E isso é apenas uma brincadeira. Desculpe, não sou bom nisso.

— Se você não está satisfeito com a sua sorte, sempre pode tentar algo novo. — Max colocou um pequeno bilhete em cima do balcão. Carter não sabia do que se tratava até perceber que tinha um número de telefone escrito.

— Você está dando em cima de mim?

— Isso é tão ruim?

— Por agora sim. Mas quem sabe daqui a algumas doses quando eu não responder mais por mim mesmo...

— Anotado. — Max sorriu enquanto se afastava.

Carter olhou mais uma vez para o número de telefone em cima do balcão e fez uma cara de desgosto. Tudo indicava que o fundo do poço não era o limite quando se tratava de sua própria queda social. Mas não havia nada tão ruim que não pudesse simplesmente piorar. A mulher de vestido prateado e jaqueta de couro que estava entrando na boate era ninguém mais, ninguém menos que Amanda Rush. E a primeira coisa que notara ao olhar o ambiente foi Carter Van Der Hills em frente a um balcão gastando seus ultimos centavos com bebidas caras.

Ela caminhou até ele e sentou-se no banco ao lado. Carter levou alguns segundos para deduzir que a mulher de cabelos negros ao seu lado era a versão original de Natalie Strauss.

— Só pode estar de brincadeira... — Sussurrou para ela.

— Parece que você viu um fantasma.

— Olha, você já conseguiu o que queria. Estou sem emprego, sem dinheiro e sem ter onde morar. Só quero sentar aqui e aproveitar minha ultima noite como um homem integrado na sociedade.

— Cassidy está morta... — Amanda ficou séria. Apesar do que Carter imaginava, ela não estava ali para debochar da sua derrota. Estava ali justamente porque era uma das pessoas que mais precisava.

— Ta falando sério?

— Ela foi assassinada ontem a noite. Eu estava lá. Eu sempre estou lá... — Amanda lançou um olhar pensativo em direção a adega a sua frente.

— Então o que eu li sobre você era verdade...

— O que você leu? — Amanda olhou para ele, inevitavelmente interessada no que ele iria dizer.

— Você sempre sobrevive, não importa o que aconteça.

— É apenas eufemismo. Seria cruel dizer que todas as pessoas morrem perto de mim.

— Não estou sóbrio o suficiente para ter esta conversa. — Carter tomou o ultimo gole de sua tequila. Pelo nível emocional da situação, era de se entender que precisava virar meio copo de uma só vez.

— Você não vale nada... — Amanda levou cinco segundos para pedir uma dose dupla ao barman que estava passando.

— Obrigado.

— É verdade. Se não fosse por você, minha única preocupação seria sobreviver outra vez. Mas agora que o mundo sabe sobre Amanda Rush eu só desejo estar morta. Obrigada. — Ela agradeceu quando recebeu sua bebida.

— Ok, eu sou um monstro, eu mereço tudo de ruim que acontece comigo. É isso que você quer ouvir?

— Só estava me perguntando porque alguém colocaria o dinheiro em primeiro lugar. Pessoas são mais importantes. — E tomou uma dose inteira da bebida que havia pedido. 


Loser by American Mary OST on Grooveshark

— Quando eu tinha dezoito anos, minha mãe decidiu viajar para Amsterdã e me deixou cuidando da minha irmã mais nova. Callie era o seu nome. Fomos morar com uma tia, depois em uma república, depois em um apartamento alugado. Ela estava cansada de nos mudarmos, não queria mais estar comigo. Então esse cara aparece do nada e simplesmente rouba ela de mim, pouco a pouco, dia após dia. Ele era um bad boy, gostava de dirigir motos. E numa noite de bebedeira ele resolveu dar uma volta pela cidade com minha irmã mais nova.

“Eu soube no dia seguinte que eles tinham sofrido um acidente e que ela tinha perdido a perna e o braço direito. Havia chances dela voltar ao normal, mas as cirurgias eram tão caras que não pudemos prosseguir. Então eu decidi passar dos limites, enganar meu chefe para que minha irmã tivesse a chance de ter uma vida normal. Ele só precisava assinar alguns cheques e então teríamos dinheiro o suficiente”.

“Passei mais de dois dias preparando um plano para roubar o dinheiro, e quando finalmente consegui, recebo a notícia de que Callie havia se suicidado de madrugada. Ela se arrastou da cama até a janela e simplesmente... Pulou. Preferiu morrer ao invés de tentar uma vida limitada. Até hoje eu não sei se entendo”.

Amanda engoliu em seco. Ficara o tempo inteiro olhando nos olhos de Carter para ter certeza se estava dizendo a verdade quando realmente não haveria motivos para mentir. Não tinha dúvidas de que ele também conhecera o sofrimento antes mesmo se saber quem era de verdade.

— As pessoas costumam morrer perto de mim também. — Carter olhou para ela. A conexão que haviam estabelecido era inegável.

— Lembrar disso faz você se sentir melhor quando comete algum crime?

— Não. Eu não sei o que é me sentir melhor.

Amanda hesitou. Entendia perfeitamente seus motivos e toda a sua história de vida, mas ele ainda era Carter Van Der Hills, um advogado sem escrúpulos que a obrigou a revelar sua verdadeira identidade ao mundo. Por que sentia compaixão por alguém tão desprezível?

 
— Nós precisamos viver... — Amanda se levantou e caminhou em direção as mesas. Carter virou imediatamente, sem entender o que estava acontecendo.

As intenções de Amanda só ficaram claras quando ela subiu ao palco ao lado de uma dançarina e começou a dançar sensualmente enquanto a nova musica rolava. Primeiro tirou a jaqueta; e tendo conquistado a simpatia do público com sua sensualidade, abriu o vestido pelo zíper lateral. Nem parecia uma simples amadora tentando chamar atenção no palco. De alguma maneira, ela conseguia igualar-se a profissional ao seu lado; talvez até mesmo superando-a aos poucos enquanto se movimentava.

Carter ficou completamente hipnotizado quando a viu usando apenas uma calcinha e um sutiã, ambos na cor preta. Ela balançava os cabelos, se jogava no chão, apalpava a outra dançarina e lançava um olhar bastante sugestivo para o público. Era bom ser desejada. Era bom saber que ainda havia alguém que lhe achasse bonita. Era bom saber que algumas pessoas sabiam apreciar o seu exterior sem qualquer interesse no que existe por dentro.

Dois minutos depois, a musica terminou, e Amanda decidiu que esta seria sua deixa. Uma vez como a deusa da boate, ela conseguiu tirar Carter do próprio esmorecimento para leva-lo diretamente a sua cama de casal. Mas parecia que nenhum dos dois estava disposto a esperar pelo longo trajeto até a verdadeira privacidade.

Mal haviam chegado a porta da mansão de Natalie Strauss e já estavam grudados um no outro, aos beijos, tentando tirar suas roupas enquanto caminhavam em direção as escadas.

— Vem comigo. — Amanda o puxou pelas mãos diretamente ao andar de cima.

O quarto ficava a pelo menos dez metros do local de subida, passando da gigantesca parede de vidro onde era situada a segunda sala de estar. Um longo caminho que Amanda e Carter tiveram que percorrer até que finalmente estivessem deitados em uma cama confortável, tirando as ultimas peças de roupas que permaneciam em seus corpos. Amanda estava pronta para deixa-lo incendiar todo o seu corpo.

O ambiente perfeito de inverno e as luzes moderadas deram o clima especial que estava faltando para ser uma noite inesquecível. Porque no final, ambos concordavam que seriam estranhos no dia seguinte.


Capítulo 12: Sobreviva ao Horror (Dia 15 de Maio de 2014)
Desculpem por não ter postado o capítulo ontem. Fiquei sem internet e tive que fazer todas as tarefas atrasadas. Mas enfim, espero que gostem. A revelação do assassino acontece na semana que vem!


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1 Comentário(s)

Um comentário:

  1. Certamente que o assassino (ou os) esta relacionado com uma personagem que conhecemos relativamente pouco mas que vai revelar um passado proximo com um dos protagonistas e assim justificar os crimes. Kyle pode estar a ser controlado até. Acho que o filho de Amanda tem algo a ver com isto. se tivesse que escolher 1 para morrer seria kyle. Otima escrita

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